Valoriza herói, todo sangue derramado afrotupy!

segunda-feira, março 01, 2010

A posteridade não é um lugar seguro


Não faz muito, saiu o livro de memórias de uma atriz que viveu com James Dean quando os dois eram jovens à procura de emprego na Broadway. A ligação durou até Dean ir para Hollywood, onde – como sabe quem tem mais de 50 anos – ele fez três filmes, se transformou numa legenda e morreu num acidente de carro, não nesta ordem. James Dean foi o rebelde sem causa original, um ídolo da adolescência incompreendida que os mais velhos, porque não a compreendiam, chamavam de juventude transviada. Cumpriu o ideal romântico de viver em velocidade, morrer cedo e ser um cadáver bonito, que é ainda mais atraente quando o cadáver não é o nosso.

Pela resenha que li, o livro trata seu assunto com carinho e não traz nenhuma grande revelação retardada – mesmo porque a bissexualidade de James Dean era conhecida há tempo. Já outro livro recente sobre Saul Bellow, de James Atlas, uma biografia não autorizada mas tolerada, dá todos os podres do autor – misoginia, homofobia, racismo, arrogância intelectual, péssimo marido – enfim, tudo que você tem o direito de ser, se você é o melhor escritor da sua geração. A posteridade não é mais um lugar seguro, e ela não está mais nem esperando você morrer para fazer sua autópsia moral.

A História com “H” majestático tem sido revisada quase que mensalmente. Hoje, por exemplo, se aceita que as invasões da Polônia e da Escandinávia e a ocupação da França por Hitler foram menos atos de força do que pantomimas consentidas, o que os próprios alemães chamavam de “Sitzkrieg”, ou guerra falsa. Já que muita gente na Europa concordava com o objetivo maior dos nazistas, que era deter o comunismo. Os ingleses e os americanos, ironicamente, ajudaram os russos a derrotar o que os outros viam como a última defesa do capitalismo ameaçado – mas não sem uma boa dose de “realpolitik” também. Há um discurso de Harry Truman quando ainda era senador e a Alemanha tinha recém invadido a Rússia em que ele propõe que se ajude a Rússia se os alemães estiverem ganhando, e a Alemanha se a Rússia começar a levar a melhor. O discurso foi desenterrado há pouco.

Razão tinha aquele general que instruía as suas tropas quando invadiam um país: “Matem os historiadores! Matem os historiadores!”
FONTE:

L. F. VERISSIMO / ZERO HORA


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