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segunda-feira, maio 30, 2011

O criador do reggae e mentor de Bob Marley, Lee Perry, sai das sombras em documentário nos EUA






A música de Lee Perry entrava por um dos ouvidos de Ethan Higbee e não saía pelo outro. Desde a faculdade, o cineasta americano sonhava se encontrar com o mitológico produtor jamaicano e convencê-lo a deixar que documentasse sua trajetória, que se confunde com o próprio surgimento do reggae, estilo que Perry ajudou a moldar, com genialidade e excentricidade, entre os anos 1960 e 70. Por isso, quando a hora chegou, ele parou na porta de um restaurante chinês em Londres, em 2005, respirou fundo, tomou coragem e fez seu papel.


- Eu estava bem nervoso, pensando que aquilo tudo era uma loucura - admite Higbee, sobre o encontro marcado pelo próprio Perry, depois de várias tentativas frustradas. - Ele estava numa mesa enorme, reunido com a família, e eu era o único ali que não era seu parente. Depois de alguns minutos de puro constrangimento, me apresentei e consegui sentar-me ao seu lado. Então, comecei a falar sem parar, dizendo que sonhava fazer um filme com ele havia mais de dez anos.


Narração de Benicio Del Toro


Para surpresa de Higbee, o arredio Perry digeriu bem a lábia do diretor e aceitou fazer o filme. Seis anos depois, o resultado daquele encontro está em cartaz nos Estados Unidos. Escrito e dirigido por Higbee e seu amigo Adam Lough,"The Upsetter" mostra a história de uma das mais incríveis figuras da música. Narrado pelo ator Benicio Del Toro, outro fã de Perry, o documentário revê a história do genial produtor de aparência macunaímica que, no lendário estúdio Black Ark, em Kingston, nos anos 1970, forjou as bases do reggae moderno, produzindo alguns dos principais nomes do gênero, inclusive Bob Marley, a quem ensinou tudo e mais um pouco.


Endeusado em fronteiras além-reggae por nomes como Paul McCartney, The Clash e Beastie Boys, entre muitos outros, essa lenda viva e ambulante, de 75 anos, raramente dá entrevistas filmadas. Por isso, as lendas o cercam como os espíritos que diz ver de vez em quando. Uma delas diz que Perry, que durante muito tempo foi um voraz consumidor de rum e cigarros alternativos, costumava soprar a fumaça destes em cima das fitas para que elas ficassem "mágicas". A outra, mais famosa, conta que, durante uma crise nervosa, o pioneiro do dub - a vertente psicodélica do reggae, que influenciou decisivamente a música eletrônica - queimou o Black Ark, transformando em cinzas todo o seu rico arquivo.


- De fato, há todas essas lendas em torno de Perry e também o fato, indiscutível, de que ele teve um papel fundamental na evolução da música pop - afirma o diretor, que entrevistou Perry em Zurique, na Suíça, onde ele se refugiou durante um tempo, assustado com os "espíritos malignos" que circulavam na Jamaica nos anos 1980. - O que tentamos mostrar no filme foi a importância dessa figura inspiradora, a partir do seu próprio ponto de vista, das suas próprias palavras.

Essa opção rendeu algumas críticas ao filme após suas primeiras exibições, em festivais na Europa e nos EUA. O que se dizia é que, apesar da originalidade do roteiro e da riqueza das imagens, muitas tiradas dos arquivos do próprio Perry, os diretores não tinham conseguido dimensioná-lo corretamente, deixando de entrevistar outras pessoas que pudessem falar sobre sua real importância.


- Foram críticas interessantes, mas que julgamos improcedentes - garante Lough. - Na verdade, entrevistamos várias pessoas ao longo desse anos: músicos, jornalistas e produtores como Roger Stefans e Adrian Sherwood, além de amigos e familiares dele. Mas, no final, decidimos não optar por esse formato batido de documentários, em que as pessoas ficam falando sem parar como alguém é genial. Achamos que Perry, com toda a sua inusitada eloquência, seria o melhor para conduzir sua própria história. Além do mais, as imagens de arquivo que ele nos cedeu são fantásticas, mostrando os primórdios do reggae, além de cenas raras dele trabalhando no Black Ark.


Quadros pintados e queimados


Durante uma das cenas do filme, reproduzida no trailer que circula no YouTube, Perry aparece queimando alguma coisa na neve, o que algumas pessoas na internet interpretaram como uma alusão ao incêndio no Black Ark.

- Ele está queimando algumas das suas pinturas - conta Higbee. - Descobrimos que ele pinta quase diariamente, inspirado pelas suas próprias canções. Depois, quando se cansa dos quadros, os incendeia ao ar livre. Perry nos disse que considera o fogo muito rejuvenescedor. Dá para perceber.

Apesar da opção dos diretores pela "inusitada eloquência" de Perry, o diretor de "The Upsetter" - que ganha versão em DVD até o final do ano - admite que incluiu legendas em algumas falas do lendário produtor, devido ao seu "jamaiquês" incompreensível:

- Confesso que houve alguns momentos em que não entendíamos nada do que ele estava dizendo.

FONTE: o globo

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