Tivemos que assistir perplexos a repetição de uma tragédia anunciada. Bastaram alguns dias de chuvas em Pernambuco e nove municípios entraram em situação de calamidade pública e 26 em situação de emergência. No total, 55 cidades foram fortemente atingidas, especialmente na Mata Sul do estado.
Há hoje 16 mil pessoas desabrigadas entre 200 mil que sofreram prejuízo com as chuvas. Comunidades inteiras de populações ribeirinhas foram destruídas em toda região metropolitana. Gente muito pobre que perdeu tudo do pouco que tinha. Dezenas sofreram ferimentos em deslizamentos de barreiras e alagamentos, muitas delas crianças.
Pelo menos duas mortes foram contabilizadas oficialmente como conseqüência das chuvas. Uma jovem de 21 anos moradora de Camaragibe, Região Metropolitana do Recife e um trabalhador rural de 54 anos, da cidade de Jaqueira, interior do estado. Duas vidas interrompidas tragicamente em deslizamento de barreiras.
Nem um ano se passou, desde junho de 2010, quando 20 pessoas morreram no estado e 26 mil ficaram desabrigadas com as enchentes na Mata Sul e os deslizamentos de barreiras na capital do estado. Agora a tragédia se repetiu: Palmares, Água Preta, Catende, Barreiros e diversos outros municípios foram novamente inundados.
A população, sem amparo do poder público, fugiu desesperada das cidades, abandonando residências, comércio e pertences pessoais. Gente que tinha perdido tudo na última enchente e tentava retomar a vida viu tudo ir novamente por água abaixo.
Nesta situação, o governador Eduardo campos (PSB) se apressou em declarar que “tudo está sob controle”, anunciou a liberação de verbas para ajuda emergencial, reconstrução das casas, e até construção de 10 novas barragens foi prometida! Mas o governo que se diz socialista não parou por aí. Declarou também que vai instalar um sistema ultramoderno de monitoramento das chuvas, tudo informatizado, ligado a satélites e equipamentos de última geração.
Só tem um problema que não dá para entender: Há dez meses houve uma tragédia na mesma proporção e nada de efetivo foi realizado pelo governo e olha que já existiam estudos para solução do problema. Há poucos meses atrás a população das cidades da mata sul denunciava que os desabrigados ainda estavam alojados em tendas, que escolas e hospitais não tinham sido reconstruídos e que os pequenos comerciantes não tiveram acesso aos empréstimos prometidos.
Crescimento econômico e desigualdade
Nesses dez meses que separaram as duas tragédias, a economia pernambucana cresceu 50% acima da média nacional, os lucros das grandes empreiteiras e dos empresários da construção civil cresceram até 500%, a arrecadação do estado cresceu 25% só nos primeiros dois meses de 2011, em relação ao mesmo período do ano anterior.
O “estranho” disso tudo é que nada tenha mudado para os trabalhadores do estado. O déficit habitacional em Pernambuco é de 300 mil moradias, cresceu o número de famílias obrigadas a morar em áreas de risco, em habitações precárias, especialmente nas cidades do pólo industrial de suape, Cabo, Ipojuca, Ponte dos Carvalhos. O crescimento em Pernambuco é só para os ricos?
Mais uma vez repetimos que a tragédia que se abateu sobre os trabalhadores de várias áreas da Região Metropolitana do Recife e em dezenas de cidades da Mata Sul do estado, não pode ser encarada como conseqüência de um fenômeno natural, como insistem em diagnosticar o governador Eduardo campos (PSB) e o prefeito do Recife, João da Costa (PT).
A absurda morte de trabalhadores, que se repetiu em menos de um ano, se deveu ao descaso dos governos federal, estadual e municipal em relação aos problemas da moradia e da pobreza em Pernambuco, uma vez que o crescimento da economia estadual não se reverte em melhoria para a população trabalhadora, em nenhum aspecto.
Estamos mais uma vez diante de tragédias anunciadas. Estes incidentes são provocados pelo assoreamento dos rios, destruição das matas ciliares, carência e má localização de barragens. Além disso, há ocupação forçada nas beiras dos rios e encostas por parte da população pobre e desempregada, expulsas pelas imensas áreas de latifúndio no campo e pela especulação imobiliária nos centros das cidades.
Em Pernambuco não existe plano de habitação popular, de urbanização de favelas ou de melhoramento urbano das áreas de risco. Tudo é feito seguindo critérios eleitorais ou para dar satisfação diante as tragédias. Mas tanto o governo estadual quanto as prefeituras da região metropolitana estão apenas empenhados no planejamento e financiamento da cidade da copa. Um conjunto de obras orçado em R$ 1, 335 bilhão.
Mais empenhados ainda estão os executivos das grandes empreiteiras, Odebrecht e Queiroz Galvão, que monopolizam todas as obras públicas no estado. Estas empresas são as grandes financiadoras de campanhas eleitorais dos governos de frente populares em Pernambuco, que agora cobram o “troco” do que gastaram nas eleições: altos lucros em detrimento do sofrimento da classe trabalhadora.
Prioridade dos governos não é a classe trabalhadora
Segundo estudos da UFRJ, é possível construir casas populares de qualidade a um custo de 12 mil reais, em regime de mutirão. Isso significa que poderíamos construir 30 mil casas para abrigar as famílias num valor total de 360 milhões, o que representa 1% do que o governo federal destina para banqueiros e empresários anualmente como manutenção de dívidas.
O governo Eduardo transfere uma verdadeira fortuna em dinheiro público estadual através de empréstimos, incentivos e isenções para as grandes empreiteiras instaladas em Pernambuco, mas não tem qualquer projeto de moradia popular. Por isso é ridículo o volume de recursos que os governos federal e estadual estão destinando para as vítimas das enchentes.
Diante da tragédia, os governos de Dilma Rousseff (PT) e Eduardo (PSB), fazem uso eleitoreiro do programa Minha Casa, Minha Vida, transformando a necessidade por moradia em fonte de lucro para as empreiteiras, além de impor uma dívida futura para os desalojados.
Ações de solidariedade classista
Por causa desse drama que se alastrou em Pernambuco, muita gente se dispõe a ajudar os mais necessitados. Só que o governo estadual e as prefeituras se utilizam da boa vontade dos trabalhadores para se eximirem de suas responsabilidades. Diante do ocorrido, as dívidas do estado e da prefeitura em bancos e empresas privadas deveriam ser suspensas para a criação de um orçamento emergencial.
É um absurdo que grandes empresas multinacionais, como Iberdrola, Wall Mart, Carrefour, que tem todo tipo de isenção de impostos montem postos de coleta para donativos. Na verdade a lógica deveria ser inversa: Que fossem taxados com impostos obrigatórios para ajuda emergencial aos desabrigados.
Defendemos o envolvimento das entidades sindicais, populares e estudantis numa campanha ativa e imediata de solidariedade aos desabrigados com a arrecadação de donativos e dinheiro. Mas propomos ações classistas, independentes dos órgãos governamentais, de figurões e de socialites das colunas sociais. Ação que se proponha não só a ajudar materialmente os trabalhadores que passam por estas privações, mas a que contribuam com a organização e se mobilização das vítimas para exigir dos governos responsáveis por esta tragédia, o direito à moradia ao emprego e à vida digna.
O PSTU defende
Decretar situação de calamidade pública no estado que permita a criação de um plano de desapropriação sem indenização dos grandes latifúndios de monocultura e de áreas de especulação imobiliária nas regiões atingidas;
Implantação de plano estadual de obras públicas para a construção de casas populares. Inicial e emergencialmente nas áreas mais atingidas da região metropolitana e do interior, mas que se estenda para todo o estado, sem o intermédio das grandes empreiteiras, sem endividar os trabalhadores, utilizando de forma remunerada a mão de obra local e com a participação dos trabalhadores através de suas organizações de classe na gestão do plano;
Controle por parte dos trabalhadores e população atingida sobre os recursos destinados para as regiões atingidas;
Criação de um imposto progressivo emergencial sobre as grandes fortunas, especialmente sobre as empresas de construção civil e grandes empreiteiras como a Odebrecht e Queiroz Galvão, e sobre os proprietários de grandes extensões de terra no estado para o financiamento do plano de obras públicas;
Perdão das dívidas e isenção das tarifas públicas para todos os trabalhadores e pequenos comerciantes atingidos;