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quinta-feira, janeiro 12, 2012

Fé e devoção marcam história da Lavagem do Bonfim na Bahia


Cortejo sai da Basílica da Conceição da Praia até a Igreja do Bonfim.
Devoção dos baianos na Cidade Baixa une o sagrado ao profano.

Tradição mantida há mais de dois séculos, a Lavagem do Bonfim é marcada pela forte presença do sincretismo religioso entre o catolicismo e o candomblé. Nesta quinta-feira (12), devotos do Senhor Bom Jesus do Bonfim e Oxalá se reúnem para festejar, prestar homenagens e pagar promessas no cortejo em direção à Colina Sagrada. Além do contexto religioso, a Lavagem do Bonfim também é caracterizada pela grande festa que acompanha e circunda o trajeto de fé.
Cerca de um milhão de fiéis e 300 baianas devem participar do cortejo que sai, por volta das 9 horas, da Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia, no Comércio, até a Igreja do Bonfim. Ao todo, 34 entidades, reunindo mais de nove mil integrantes, foram cadastradas pela Empresa Salvador Turismo (Saltur) para participar do evento. Dentre elas, 18 são de percussão, cinco de sopro, dois de samba, além de afoxé, instrumental, som mecânico, kuduro e marchinha de carnaval. A expectativa é de que o cortejo chegue à Basílica do Bonfim ao meio-dia, quando o adro e as escadarias são tradicionalmente lavados pelas baianas com vassouras e água de cheiro.
Há mais de 20 anos, a professora Mercês Palma participa da Lavagem do Bonfim com um grupo de amigos. Devota de Senhor do Bonfim e também de Oxalá, Mercês revela que sempre gostou das festas de largo e já perdeu as contas de quantas participou. Para ela, a lavagem do Bonfim tem um significado especial. “É uma oportunidade de encontrar os amigos. Tem muita alegria no cortejo”, diz ela. Assim como a professora, o motorista Afrânio Gama, de 52 anos, participa da lavagem desde os 16 anos, e nesta quinta-feira pretende levar toda a família para realizar o cortejo da Basílica da Conceição da Praia até a Igreja do Bonfim. “Esse ano eu vou juntar a família toda para realizar o trajeto e aí a gente comemora. É um dia de festejos”, anima-se Afrânio.
História
Segundo Padre Edson Menezes, pároco responsável pelo templo no Bonfim, a partir da proibição, foi iniciada a tradição da lavagem das escadarias. “Após essa determinação, o pessoal do candomblé começou a fazer o cortejo para lavar escadarias”, conta. Na procissão, fiéis se vestem de branco e acompanham baianas que carregam a água de cheiro e vassouras para lavar as escadarias. “Esse ato passou a ser religioso, de penitência e agrega muitas pessoas. No contexto maior, o sentido da lavagem é religioso, independente da crença”, revela o padre.Segundo relatos históricos, a lavagem do Bonfim começou a partir dos moradores da região que tinham o objetivo de lavar a igreja para deixá-la pronta para a Festa do Bonfim, realizada pelo catolicismo no segundo domingo após o Dia de Reis, que acontece no dia 6 de janeiro. A “faxina” do templo religioso acontecia três dias antes da festa, numa quinta-feira. A chegada até à colina sagrada era marcada por muita dança durante o cortejo, o que provocou a proibição da lavagem da igreja, em 1889, pelo arcebispo da Bahia Dom Luís Antônio dos Santos.
Sincretismo
Para a historiadora Wlamyra Albuquerque, as críticas que os líderes religiosos fazem ao sincretismo devem ser compreendidas no contexto de cada segmento religioso. “Quando uma Ialorixá diz que Senhor do Bonfim não é Oxalá ela está demarcando não só no campo religioso, mas também político, a autonomia do candomblé em relação a Igreja Católica hoje”, avalia a pesquisadora. Segundo ela, “a lavagem do Bonfim ventila a cultura popular baiana, porque continua a ser um espaço para reinventá-la. Não é uma festa do passado a se repetir, mas um festejo antigo que recriamos a cada ano”. Apesar dos significados distintos para as religiões, baianos e turistas preservam a cultura "sincrética" traçada desde o princípio das celebrações religiosas na Bahia e fazem da lavagem do Bonfim a festa de largo mais importante de Salvador.Contrária ao sincretismo, Valdina Pinto, que é Makota (alto cargo feminino dentro da religião do candomblé) do terreiro Tanuri Junsara, em Salvador, afirma que a lavagem do Bonfim não é ligada ao candomblé e sim à cultura popular. “Hoje já tem muito folclore. É o candomblé? Não, não é o candomblé. Aquela água (a água de cheiro que lava a escadaria) não tem nada a ver com a água de Oxalá. A água de Oxalá é uma outra coisa. O fundamento é outro. Ali é uma prática popular”, defende Makota Valdina. Segundo ela, a fé das pessoas que fazem o percurso é que faz da lavagem uma festa especial. “As pessoas vão lá pela fé no Senhor do Bonfim? Vão. Fazem promessas? Fazem. Alcançam? Alcançam. Porque o espiritual transcende o material e a fé está ligada à espiritualidade, que é invisível”, conclui.

FONTE: G1

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