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terça-feira, abril 07, 2009

Atores do filme 'Capitães de areia' têm histórias parecidas com as dos personagens do livro de Jorge Amado

Quando a diretora Cecília Amado começou a procurar o elenco para filmar o livro "Capitães da areia", foi atrás de experiências de vida bem próximas das aventuras descritas no romance de 1937.
O convívio com os atores, todos pinçados de comunidades carentes de Salvador, deu à cineasta a noção exata de como a obra escrita por seu avô, Jorge Amado, continua atual.

- A maior parte deles são os próprios capitães da areia. Quase todos já passaram noites nas ruas ou venderam algo nos sinais de trânsito. Alguns até já se envolveram com crimes, drogas ou, ao menos, têm parentes e conhecidos nessa situação - conta Cecília, que encontrou o elenco após um cuidadoso trabalho com ONGs de Salvador.
- Eles emprestam essa vivência de rua para os personagens e, assim, dão realismo a seus papéis.
A segunda parte das filmagens acabou mês passado, e o longa-metragem, com trilha sonora de Carlinhos Brown, deve estrear em 2010.
Vai ser a primeira adaptação para o cinema do livro que, mesmo 70 anos após a primeira edição, segue motivando produções artísticas e sendo utilizado em instituições de ensino. "Capitães da areia" conta a história de um bando de adolescentes infratores que vivia numa praia na Salvador dos anos 30, desfrutando da liberdade das ruas, mas também lidando com as amarguras do submundo do crime.

- A obra ainda é essencial. Está certo que, hoje, as ruas são muito mais violentas. O consumo de crack em Salvador é terrível. Mas os menores de idade vão para as ruas pelos mesmos motivos de antes: uma família desestruturada e condições de moradia degradantes - explica a diretora. - Já a classe média se apaixona pela liberdade dos capitães.

Segundo Cecília, o livro de seu avô é genial porque se fixa no ponto de vista dos personagens. Para se apoiar nessa mesma sacada, a cineasta investiu na formação do elenco. A busca por atores começou em 2007 e mobilizou 22 ONGs baianas. Mais de mil adolescentes e jovens se inscreveram no processo de seleção. Do total, foram escolhidos 90 atores, e, após dois meses de oficinas de interpretação, a equipe elegeu os 12 que viveriam os personagens principais, como Pedro Bala, Gato, Dora e Sem-Pernas.

- Havia muita gente talentosa. Mas me mantive fiel aos personagens. Cada ator recebeu o papel que mais se parecia consigo - conta a diretora.

O baiano Jean Luis de Amorim, de 14 anos, por exemplo, vive o mítico Pedro Bala, manda-chuva dos capitães da areia. Segundo Cecília, o garoto é perfeito para o papel. Jean é um líder nato, ela diz. Cresceu andando em bandos no Pelourinho. É safo e ajudava na renda de casa catando e vendendo papelão pela cidade. Já o ator Paulo Raimundo Abade, 16 anos, interpreta o Gato e personifica a figura do baiano malandro e conquistador.

- Desde os primeiros testes, o Jean mostrou vocação para liderança, mesmo sendo um dos mais jovens no elenco. Não tivemos dúvida para elegê-lo nosso Pedro Bala - conta a diretora. - Já o Raimundo é o baiano charmoso, de corpo perfeito. Encontramos ele por meio de uma ONG voltada para menores infratores.

Realidade e ficção continuam se misturando enquanto Cecília descreve seus pupilos. Jordan Mateus, 17 anos, é gaiato e irônico como o personagem Boa Vida. Ana Graciela Conceição, 14 anos, é uma guerreira ao estilo da carismática Dora, única menina entre os capitães de Jorge Amado. Robério Almeida, de 18 anos, o Professor, é mesmo o mais experiente da trupe e um dos únicos que já atuou em teatro.

E a história mais cativante talvez seja a de Israel Gouveia, adolescente de 15 anos no papel de Sem-Pernas, o portador de deficiência física que é adotado por uma família só para, depois, facilitar o roubo da casa pelo bando.

- Procurei um adolescente deficiente físico, porque, do contrário, seria difícil para um ator inexperiente passar realismo. E precisava ser doce o bastante para cativar uma família. Encontramos o Israel num centro de reabilitação. Ele teve um acidente ainda bebê, e uma parte do seu corpo é atrofiada. Seu pai achava que o filho deveria ter sido largado no hospital, mas sua mãe é uma mulher incrível, que o criou. Israel tinha dois lados. Era alegre e explosivo, mas aprendeu a se controlar ao longo das filmagens - conta Cecília.

Segundo a cineasta, que faz sua estreia como diretora de um longa, tem sido curioso ver o elenco amadurecendo durante as gravações. Ela conta que trabalhar com uma galera tão jovem é gratificante, mas também complicado. Lidar com temperamentos e hormônios em ebulição foi, por vezes, um desafio difícil.

- Atravessamos madrugadas filmando, e foi como uma montanha-russa. Às 2h, eles podiam estar numa excitação incontrolável e, logo depois, ficavam exaustos e queriam ir embora, recusando-se a repetir cenas. Como se pensassem "não quero mais brincar disso" - explica ela.
O GLOBO

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito interessante essa inovadora seleção de atores... acredito que isso vá valorizar a produção do filme ... e proporcionar boas oportunidades para esses jovens!!!