Valoriza herói, todo sangue derramado afrotupy!

terça-feira, março 22, 2011

Inventário das florestas brasileiras revela riqueza verde do país




Cada vez mais concentrada em cidades, a população brasileira cresce ignorando a imensidão verde que ocupa 60% de nosso território: as florestas. Ao contrário de outros países de extensa área florestal, o nosso pouco fez para mapear sua flora. Detalhes como o tipo de relevo e solo, número de grandes árvores e quantidade de matéria orgânica morta vêm de levantamentos defasados ou, na melhor das hipóteses, limitados a algumas regiões. Essa falha nas estatísticas, no entanto, deve acabar ou se reduzir. O governo federal pôs em campo a segunda edição do Inventário Florestal Nacional (IFN) - o primeiro trabalho foi concluído 28 anos atrás. Os pesquisadores envolvidos com o projeto visitarão quase 20 mil pontos de vegetação nos próximos cinco anos.

O IFN é o mais próximo que o Serviço Florestal Brasileiro (SFB) chegará de um censo da flora. É, portanto, uma iniciativa ambiciosa. O órgão entrará em pelo menos uma área verde a cada 20 quilômetros do território nacional. Até 10 mil pessoas participarão da busca e análise dos recursos naturais coletados. Regiões nunca analisadas devem receber equipes de Brasília. Para levar a caravana verde país afora, serão necessários R$ 150 milhões - parte virá dos cofres estaduais, na medida em que governadores aderirem ao projeto. Por enquanto, fiscais e pesquisadores atuam apenas em Santa Catarina. As conversas estão avançadas no Distrito Federal e em Sergipe. No Rio, os trabalhos começam em abril.

As autoridades fluminenses mostraram interesse especial pelo projeto. O SFB elegeu 122 pontos no estado por onde os pesquisadores deveriam passar. A Secretaria de Ambiente do Rio, porém, quer levar o inventário a 333 localidades, dos corredores florestais ao Complexo Petroquímico de Itaboraí, no leste fluminense.

As chuvas de janeiro provocaram estragos ainda não totalmente calculados na Região Serrana. Estima-se que cerca de 2 milhões de árvores caíram durante as enchentes. Esta e outras contas ligadas aos recursos naturais poderão ser confirmadas durante a realização do inventário florestal no estado.

Outras surpresas virão ao longo dos cinco anos de inventário. A maioria sairá da própria floresta. Estima-se que a contagem inédita engrossará a lista de espécies da flora ameaçadas de extinção (hoje, são 472). E há grande possibilidade de encontrar novas espécies. A expectativa vale até para territórios mais devastados - como a Mata Atlântica, reduzida a 8% de sua cobertura original, e o Cerrado, que já perdeu metade de sua área. Se o inventário for concluído como o planejado, as florestas brasileiras deixarão de ser ilustres desconhecidas.

O número de florestas do Brasil é um mistério. Considerando a definição adotada pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), o país teria milhares delas. Segundo a FAO, floresta é uma área superior a meio hectare, sem uso urbano e com árvores maiores que 5 metros de altura. Ela pode ser menor, portanto, que um campo de futebol. E estar presente em tantas propriedades que o poder público ignoraria muitas delas. Mas até a menor das florestas pode dar uma contribuição ao inventário.

- Vamos identificar áreas isoladas e muito pequenas, que podem nos ajudar a entender as nuances de cada ecossistema - revela Antônio Carlos Hummel, diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro (SFB). - Estes fragmentos minúsculos podem mostrar espécies que imaginávamos estar extintas. Ou podemos encontrar ali novas espécies.

O inventário contribuirá para o estudo da biodiversidade atualizando a lista de plantas recém-descobertas ou ameaçadas de desaparecimento.

- Há muitas espécies das quais não temos informações suficientes sobre a área de distribuição ou o modo como sofrem com o desmatamento e a chegada de espécies invasoras - destaca Bráulio Ferreira Dias, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente.

A urgência da pesquisa ganha destaque especial na Mata Atlântica. O bioma já perdeu mais de 90% de sua cobertura original. A porção sobrevivente, além de ínfima, é fragmentada. Ainda assim, as taxas de extinção registradas são pequenas. É como se todas as espécies tivessem perdido habitat, mas ainda teimassem em sobreviver. O inventário confirmará se é este mesmo o caso - ou se a devastação foi irreversível para muitos tipos de plantas.

Entre as espécies mais procuradas está o pau-brasil - símbolo-mor da exploração predatória desde os tempos coloniais, agora quase restrito ao Rio e à Bahia. Também são poucas as remanescentes das araucárias. Outrora onipresentes no sul do país, elas restringem-se hoje a 3% de sua área original. A lista de espécies madeireiras sob risco de extinção abrange ainda a cerejeira, o jacarandá-da-bahia e a imbuia (todos na Mata Atlântica), a castanheira e o mogno (ambos na Amazônia).

- Há declínios evidentes de algumas espécies, mas ainda podemos reverter essa tendência de desaparecimento - opina Dias. - O inventário dará mais clareza aos nossos projetos.

O censo das plantas também dará mais respaldo a pesquisas sobre mudanças climáticas. Um dos objetivos do projeto é identificar qual é o estoque de biomassa - e, consequentemente, de carbono - das florestas brasileiras.

- As florestas têm recebido um papel central na discussão sobre o clima - destaca Hummel. - Enquanto não as conhecermos, vamos falar sobre elas, inclusive nos fóruns internacionais, na base do achismo.

Mas, até conhecermos melhor a imensidão verde que ocupa a maior parte de nosso território, será preciso paciência. Diferentemente de um censo demográfico, iniciado simultaneamente em todo o país, o trabalho com as plantas vai demorar três anos até finalmente chegar ao último dos 26 estados. A adesão será gradual por conta da dificuldade para conseguir recursos e da necessidade de negociar apoio com universidades e governos estaduais. Em alguns estados - como o Amazonas, onde 3.906 pontos de floresta foram incluídos no inventário -, os pesquisadores precisarão de suporte logístico das Forças Armadas para chegar aos locais do levantamento.

A intenção de Hummel é que o Censo nacional seja finalizado em 2016. Mas no mesmo ano será iniciada uma nova edição do inventário, ocupando os pesquisadores durante mais cinco anos. A pesquisa permanente é um modelo semelhante ao adotado nos EUA e na China, também donos de extensos territórios e, portanto, de uma contagem dispendiosa.

- Queremos um financiamento permanente para esta atividade - reivindica o diretor do SFB. - A intenção é, também, apresentar resultados preliminares na Rio+20, encontro que será realizado pela ONU no ano que vem.

No cenário internacional, o Brasil tem muito do que se orgulhar. Segundo as estimativas ainda em vigor, o país lidera o ranking mundial de estoque de carbono na biomassa florestal viva. É, além disso, o segundo em área florestal - perdendo apenas para a Rússia, cujo território é o dobro do nosso. Mas, quando o quesito é a quantidade de florestas plantadas, caímos para a oitava posição, atrás até de Japão e Polônia.

- Estamos muito aquém do nosso potencial para plantio de florestas - lamenta Hummel. - A China planta 4 milhões de hectares por ano. Nós, apenas 500 mil.

Além do uso industrial, o plantio de vegetação serve também para fins conservacionistas. E o uso da floresta pela população em seu entorno será mais um dos itens explorados pelo inventário. A medidas objetivas como o diâmetro das árvores, os pesquisadores anexarão um questionário, aplicado em comunidades vizinhas, indagando sobre sua relação com o verde.

FONTE: O GLOBO

Nenhum comentário: