Mais um 8 de março, mais um momento de dizer em alto e bom som: somos militantes, somos lutadoras, queremos Reforma Agrária e igualdade. O acúmulo de tantas lutas já deixa claro: o foco das ações é o enfrentamento ao agronegócio.
Neste 2011, os agrotóxicos ganham destaque. Um dos pilares do modelo de exploração capitalista da agricultura, os venenos são utilizados em larga escala em nosso país. Larguíssima: o Brasil tem o triste título de “campeão” no consumo desse tóxico.
As mulheres querem denunciar essa realidade, assim como denunciar a violência, que também pode ficar escondida por trás de belas fotografias ilusórias.
Confira a entrevista com Marisa de Fátima da Luz, assentada na região do Pontal do Paranapanema (SP), e integrante da Coordenação Nacional do MST.
Qual o tema principal da jornada este ano?
A jornada das companheiras é identificada a partir de alguns temas, vindos dos debates e das lutas. Fundamentalmente é a perspectiva de dar continuidade na luta ao enfrentamento do agronegócio no campo e para este ano com mais visibilidade à temática dos agrotóxicos. E também o debate da continuidade da formação das companheiras e a questão da violência contra a mulher. Esse é um tema que precisamos trabalhar no decorrer das jornadas do 8 de março. Mas fundamentalmente são ações de denúncia do agronegócio, especialmente dos malefícios dos agrotóxicos.
Em relação aos agrotóxicos, quais são os tipos de ações previstas?
Temos construído diferentes formas de lutas e atividades nos estados: desde lutas contra empresas produtoras como ações de denúncia para a sociedade. Faremos debates amplos sobre o tema, que aglutina a opinião do conjunto da sociedade, que pauta a soberania alimentar.
Que tipo de ações serão realizadas?
Sim, temos buscado consolidar o 8 de março como um espaço de construção conjunta. Para nós mulheres do MST é muito importante garantir que as atividades e lutas das mulheres sejam articuladas com a Via Campesina. É uma necessidade política, organizativa. Buscamos não só garantir a participação das companheiras de outros movimentos mas que elas efetivamente participem do planejamento e construção das ações. Essa é uma orientação nossa, garantir a luta de forma unitária.
Qual o recado que as mulheres camponesas têm a dar na questão dos agrotóxicos?
Para nós é uma necessidade fazer a denúncia do avanço do capital no campo. E a temática dos agrotóxicos deixa clara essa realidade. É um tema que dialoga com nossa realidade, e que também precisa ser colocado para o conjunto da sociedade, que afeta a todos. A produção em grande escala com venenos traz conseqüência para a vida das pessoas, seja no campo, seja na cidade. Temos necessidade de consolidar esse debate na cidade, que é um debate para a humanidade.
Dá para colocar a Reforma Agrária e a agricultura familiar como um contraponto à produção em larga escala, à base de venenos?
Esse tema coloca um desafio para nós. Enfrentar um modelo tecnológico e político da agricultura convencional hoje é muito difícil. Precisamos caminhar primeiro na resistência e também colocar a construção de outras alternativas para a agricultura camponesa, que possam avançar na perspectiva de uma produção agroecológica. É um desafio muito grande para toda a sociedade, porque a disputa é em torno do modelo de produção, o modelo da agricultura para o país.
A produção dos assentamentos, tendo condições de chegar até as cidades, poderia ser uma alternativa aos alimentos envenenados?
Temos buscado construir experiências que precisam estar presentes no conjunto da sociedade. Nossa forma de produzir precisa ser visível, precisa servir de exemplo. Não estamos só denunciando, temos propostas para contrapor o modelo de produção capitalista no campo.
O que está colocado em relação à violência contra a mulher?
Essa situação não está presente só nas áreas de Reforma Agrária, mas no conjunto da classe, na área urbana. Sem debater a violência contra a mulher é difícil pensar uma sociedade nova, um homem e uma mulher nova. Isso não quer dizer que abandonamos a linha política central de enfrentamento ao capital no campo. Essa é nossa orientação geral, mas o tema da violência precisa ser considerado na realidade dos estados, que têm tentado construir suas formas de pautar o tema, seja em espaços de formação internos, seminários.
O que vem sendo feito junto aos companheiros em relação a essa temática?
Estamos buscando construir alguns espaços de debates, por ora mais entre mulheres. Claro que é um tema que precisa ser debatido por todos, e queremos caminhar nesse sentido. Por isso pautar agora, para deixar claro que existe esse problema, e que precisamos aprofundar esse olhar. Os estados têm a orientação de trabalhar essa temática, também junto a outras organizações, da cidade.
O que as mulheres e o MST acumularam com as lutas do 8 de março?
O fato de as mulheres desenvolverem experiências todo ano, na perspectiva de garantir uma unidade e a luta, já é um acúmulo político. Esse processo histórico já um fator positivo. Outro avanço é a percepção da necessidade de as mulheres se organizarem, construírem suas lutas. O que a gente observa nesse último período é que as mulheres têm buscado, a partir de uma análise da realidade e da questão agrária, o enfrentamento do modelo do capital no campo, que é um acúmulo dos 8 de março. Esse é um fator que vem acumular para a luta política do MST. Nós enquanto Movimento temos que nos reposicionar para enfrentar essas lutas.
Houve um avanço na formação política das mulheres, as companheiras estão participando de mais espaços de direção ao longo dos anos?
Quais os desafios colocados para o Setor de Gênero e para as mulheres do MST?
Consolidar, reforçar, dar um caráter organizativo para as lutas das mulheres no MST. Essa é uma tarefa, e um desafio: construir espaços de participação, envolver as companheiras na efetivação do conjunto das lutas. Precisamos de mais experiências concretas de envolvimento das companheiras, de envolvimento orgânico, na base, nos setores, nas instâncias do Movimento. As companheiras precisam se considerar – e ser – parte do processo de construção. E dar continuidade à perspectiva de trabalhar na questão da formação política.
FONTE: Jornal Sem Terra
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