Com o aumento dos assassinatos entre a população negra, a probabilidade de um preto ou pardo ser vítima de assassinato passou a ser 2,4 vezes maior do que a de um branco. Em 2006, era 1,9
Em junho de 2011, o menino Juan Moraes voltava para casa, na Favela Danon, município de Nova Iguaçu (RJ), quando foi morto a tiros. O que aconteceu no instante em que foi morto é nebuloso e ainda não foi totalmente esclarecido, pois o caso ainda será julgado pelo Tribunal do Júri. A denúncia do Ministério Público (MP), no entanto, relata que Juan, negro, 11 anos de idade, foi morto por policiais militares, que faziam uma operação na favela. De acordo com o MP, os policiais pensaram que ele era um traficante de drogas. Ao perceber que tinham matado um menino desarmado, os policiais tentaram ocultar o crime escondendo o corpo.
O crime, talvez, nunca tivesse a autoria identificada se um irmão de Juan, ferido na ação, não sobrevivesse. Foi ele quem relatou o desaparecimento do irmão e a tentativa dos policiais em sumir com o corpo. Juan foi um dos 35.207 cidadãos negros assassinados no país em 2011, segundo levantamento feito pela Agência Brasil com base em dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde.
Cruzando as informações do ministério com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), verifica-se que, em 2011, a taxa de homicídios dessa população foi 35,2 por 100 mil habitantes, taxa 9% acima do que a observada cinco anos antes, quando foram registrados 29.925 casos, ou seja, 32,4 por 100 mil habitantes.
Ao mesmo tempo em que negros ficaram mais vulneráveis à violência nesses cinco anos, a taxa de homicídios da população branca caiu 13%, ao passar de 17,1 por 100 mil habitantes em 2006 (15.753 em número absoluto) para 14,9 por mil em 2011 (13.895 casos).
O dado reflete a grande disparidade racial que existe no Brasil, quando se trata de vítimas de assassinatos. Com o aumento dos homicídios entre a população negra, a probabilidade de um preto ou pardo ser vítima de assassinato no país passou a ser 2,4 vezes maior do que a de um branco. Em 2006, a proporção era 1,9.
Mãe de um jovem negro executado em 2006 por um grupo de extermínio, na Baixada Santista, em São Paulo, Débora Maria da Silva não vê uma melhora na situação no país. O gari Edson Rogério Silva dos Santos foi morto a tiros em maio de 2006, durante uma onda de ataques no estado de São Paulo, quando saía para comprar remédio.
Para a mãe de Edson, os negros são as maiores vítimas, porque moram nas áreas mais pobres da cidade. Segundo ela, o Estado ainda mantém uma postura racista, mesmo 125 anos após a abolição da escravatura no país.
“Não vivemos mais no tempo da escravatura, que se tem coronéis, capitães-do-mato e sinhozinhos. Apesar de permanecerem as senzalas, que são as periferias, e os porões dos navios negreiros, que são os presídios”, disse Débora, que lidera um movimento por justiça para os assassinatos de maio de 2006, o grupo Mães de Maio.
Para o coordenador da organização não governamental (ONG) Observatório das Favelas, Jaílson de Souza, o aumento da taxa de homicídios de negros tem relação com a mudança geográfica dos assassinatos no país. Nos últimos anos, enquanto o Sul e o Sudeste têm vivenciado a redução das taxas de homicídios, o Norte e Nordeste têm visto um aumento da violência.
Esses estados, segundo Souza, são os que concentram as maiores populações de pretos e pardos. “Quando essa geografia da morte muda, e há mais violência no Norte e Nordeste, essa mudança acaba por gerar mais morte de negros, sejam pardos ou pretos. Em Alagoas, por exemplo, há um branco para cada 20 negros”, disse.
Dos cinco estados onde o assassinato de negros mais cresceu, quatro são do Nordeste e um no Norte. O Rio Grande do Norte teve um crescimento de 2,7 vezes na taxa de homicídios, ao passar de 16,1 por 100 mil habitantes, em 2006, para 43,6 por 100 mil, em 2011. Na Paraíba, a taxa dobrou, de 30,1 para 60,3 por 100 mil.
Entre os outros estados onde o crescimento foi grande entre 2006 e 2011, estão Alagoas (de 53,9 para 90,5 por 100 mil habitantes), o Amazonas (de 22,3 para 42 por 100 mil) e Ceará (de 17,8 para 29 por 100 mil).
Para o o coordenador do Observatório das Favelas, o crescimento econômico do país, sem uma mudança da estrutura social, também contribui para o incremento da violência entre as populações mais vulneráveis. “Nosso desafio é reconhecer que não basta o crescimento econômico, tem que ter uma política que leve em conta o racismo, que é um elemento estrutural da desigualdade brasileira.”
FONTE: CARTA CAPITAL / Com informações da AGÊNCIA BRASIL
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