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sábado, outubro 25, 2014

'Estilo Mujica' marca campanhas na eleição presidencial no Uruguai







Mesmo fora da disputa presidencial, Mujica influencia estilo de candidatos ao posto 

A campanha presidencial uruguaia chegará ao fim do primeiro turno neste domingo com um diferencial que faz com que a presença do atual ocupante do posto, José Mujica, transcenda partidos e projetos.

Aparentemente influenciados pelo estilo de Mujica, os presidenciáveis vêm apostando na humanização e em uma apresentação informal da sua imagem pública como instrumento de aproximação com o eleitor.

É possível perceber isso, por exemplo, em relação ao líder das pesquisas - o candidato da governista Frente Ampla, o oncologista e ex-presidente Tabaré Vázquez - e no caso do segundo colocado, o advogado Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional (ou Blanco).

"Cada um deles quer deixar clara uma atitude, uma maneira de viver. Não é uma questão de repetir a postura humilde de Mujica, mas de mostrar sensibilidade. De se apresentarem como pessoas próximas ao homem comum", diz o analista político Alvaro Padrón à BBC Brasil.

A marca de Mujica se vê não só na campanha, segundo o cientista político Daniel Chasquetti, mas também na política uruguaia em geral.

"Parece que caiu bem aos uruguaios ter um presidente mais parecido ao cidadão médio. Vemos, por exemplo, que Lacalle Pou cultiva essa ideia de se mostrar como um homem comum."

No entanto, Chasquetti relativiza a "novidade" instalada por Mujica ao lembrar que, no Uruguai, os presidentes nunca foram inacessíveis.

"Lembro-me de uma vez haver cruzado com o então presidente Julio Sanguinetti no supermercado fazendo compras de mês."

Ativo político
Luis Pou, do Partido Nacional, está em segundo lugar, segundo pesquisas recentes.

A gestão atual conta com 56% de aprovação dos uruguaios, segundo dados divulgados pelo instituto Equipos Mori na semana passada.

Em contrapartida, a Frente Ampla – coalizão da qual fazem parte vários partidos de esquerda, entre eles o Movimento de Participação Popular (MPP), liderado por Mujica – registra intenções de voto que oscilam entre 41% e 45%, de acordo com os três maiores institutos de pesquisa do país, que divulgaram na quarta-feira seus mais recentes resultados.

Segundo estes índices, portanto, o número de uruguaios que avaliam positivamente o governo de Mujica supera o daqueles que pretendem votar na esquerda.

O segundo colocado, Lacalle Pou, aparece com uma intenção de voto que oscila entre 29,2% e 33,4%.

Em terceiro, Pedro Bordaberry, também do Partido Colorado, alcança entre 13,5% e 18%.

Para o próximo domingo, espera-se que nenhum dos partidos alcance maioria absoluta e que os dois primeiros colocados voltem a se encontrar em um segundo turno, marcado para 30 de novembro.

"A coalizão precisa de Mujica e de seu partido, que não por acaso tem como slogan 'A força que Pepe construiu'. Para a Frente Ampla, a eleição está mais competitiva do que se esperava, então, ela não pode se dar ao luxo de dispensar um dos seus principais ativos, não só como presidente, mas também como líder interno", avalia Padrón.

"Além do mais, Mujica faz política o tempo todo, mesmo quando vai ver o show do Aerosmith.”

Para Chasquetti, apesar de a Presidência atual ter trazido novidades, não chega a ser um divisor de águas.

"Vázquez terminou seu governo com um índice de popularidade superior ao que Mujica tem hoje e, no entanto, os uruguaios se esqueceram de Vázquez rapidamente", pondera.

"Tenho minhas dúvidas sobre se viveremos um 'antes e depois' de Mujica. O mundo vê um Mujica, e os uruguaios veem outro."

Padrón observa que a popularidade do presidente é advinda da sua sobriedade, da capacidade de comunicação e da repercussão internacional alcançada não só por seu estilo, mas também por importantes mudanças implementadas durante sua gestão.

Entre elas, estão o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a descriminalização do aborto e a estatização da produção e da venda de maconha, além da recente recepção de famílias sírias refugiadas e da decisão de acolher presos de Guantanamo.

O cientista política acredita que tudo isso estabeleceu um patamar de popularidade difícil de ser mantido pelo próximo presidente.

"Não importa quem vencer as eleições, vamos compará-lo permanentemente com Mujica. Ele vai deixar uma marca: o valor de algo que instalou no cenário mundial."

Mujiquização
Mesmo proibido de se opinar na eleição presidencial, Mujica está por todos os lados.

Por isso, mesmo sem estar oficialmente presente nos palanques (uma limitação imposta pela Constituição, já que a reeleição no Uruguai não existe e o Presidente em exercício também não pode fazer campanha para quem quer que seja), Mujica está na prática por todos os lados.

Além disso, é candidato ao Senado pelo Espaço 609, um subgrupo do MPP, o que faz com que sua imagem figure, mais do que nunca, em folhetos, broches e adesivos.

"A informalidade veio para ficar. O primeiro efeito de ordem prática dessa 'mujiquização' da política uruguaia é que é difícil que políticos agora usem gravata. Antes, não era assim", exemplifica Padrón.

O esforço de empatia vai além. Aos 41 anos, Lacalle Pou, filho do ex-presidente Luis Alberto Lacalle, aposta na juventude e em uma proposta política "positiva" como diferencial.

Em um dos momentos de maior polêmica desta campanha, Pou fez uma "bandeira" (movimento físico de se colocar em perpendicular, a partir de um ponto de apoio vertical) e desafiou Tabaré Vázquez, de 74 anos, a fazer o mesmo.

Bordaberry, filho do ex-ditador Juan María Bordaberry, recorreu à ideia de mudança e novas ideias.

Além de conversar com crianças sobre o futuro do país na campanha na TV, vem se arriscando no português para mostrar o que vê ser uma similaridade entre a ascensão de Aécio Neves e a sua, pelo fato de o candidato brasileiro ter figurado em terceiro lugar nas pesquisas de primeiro turno e ter chegado ao segundo turno. Ele diz que "a virada já começou".

Já Vázquez é pouco afeito a declarações e é "o mais afastado de uma relação massiva com os meios de comunicação", segundo Padrón, mas ele próprio vem se mostrando mais acessível, ao participar de programas populares de entretenimento, apesar de ter se negado a estar nos debates, algo impensável para Mujica.

"O contraste de estilo entre os dois é enorme, mas o fato de Tabaré, mesmo sendo um oncologista de prestígio, ter voltado à política deixa a ideia de que ser Presidente é algo que lhe acontece quase por acidente", pondera Padrón.


"Mujica é agricultor, Vázquez é médico. Os dois buscam uma legitimidade que esteja afastada da ideia da política como modo de vida. E como Lacalle Pou se encaixa nessa busca? Com a idade, como alguém que estabelece a diferença por preferir não pensar em termos de velhos debates. O fio condutor é tentar fazer com que as pessoas voltem a se aproximar da política e dos políticos."

FONTE: BBC-BRASIL / Denise Mota

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