A holandesa que faz parte das Farc explica motivos que
levaram guerrilheiros às armas
Tanja Nijmeijer se levanta da mesa para
ir embora, com mais um um cigarro na mão. É noite de terça-feira e seu rosto
mostra uma expressão atormentada, a mesma da segunda-feira durante as seis
horas de entrevista.
- Estou cansada de ter que me defender
constantemente - diz a representante holandesa das Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia (Farc) nas negociações de paz. - É importante que
se entenda por que pegamos em armas e que na Colômbia existe uma guerra que
produz mortes. E sim, às vezes cometemos erros.
Tanja, de 34 anos, nasceu em Denekamp
(Holanda) e é a segunda das três filhas da família. Em entrevista ao “El País”,
ela conta, cheia de ardor, como é sua vida nas Farc, a organização guerrilheira
que faz parte desde 2002. E se parece muito surpresa com o interesse da mídia.
- Eu gostaria que eles prestassem mais
atenção às condições de vida das pessoas. Não seria muito mais importante do
que falar de mim?
O caminho que levou Tanja à guerrilha
colombiana foram dois acontecimentos vividos em 2001, durante o período que
viveu no país. O primeiro foi uma visita a um bairro pobre da cidade de
Pereira. Seu acompanhante lhe disse que teriam que sair de lá às 21 horas,
porque as pessoas iam dormir.
- Quando perguntei a um vizinho do
bairro porque ele foi para a cama tão cedo, ele disse que os paramilitares
poderiam considerar como criminoso alguém que andasse a essa hora na rua e
matá-lo com um tiro. Isto é chamado de limpeza social na Colômbia.
O outro incidente ocorreu em Bogotá. Ele
foi visitar Ciudad Bolívar, um bairro gigante de favelas ao sul da capital.
Depois a levaram para o Centro Andino, o centro comercial da elite do norte da
cidade. O contraste era muito doloroso. Tanja mergulhou na história da
Colômbia, buscou os contatos certos no país e entrou na guerrilha. - Para mim,
ficou claro que a democracia na Colômbia só existia no papel. E assim permanece
até hoje.
Alguns pensam que as Farc recorrem a
você - uma mulher ocidental, inteligente e eloquente- para melhorar sua imagem.
Tanja Nijmeijer: Me incomoda ouvir que sou parte da
campanha de comunicação das Farc. O que queremos é contar a nossa visão das
coisas. O governo colombiano colocou muitas dificuldades na minha participação
nas negociações de paz.
As Farc nasceram em 1964. Qual é a sua luta atual?
Tanja Nijmeijer: Os tempos mudam, mas a opressão
continua. Nos consideramos um partido político armado, cuja ideologia é baseada
no marxismo-leninismo. Essas são as ideias pelas quais lutamos. Queremos fazer
reformas radicais. O que nós queremos saber é como podemos participar da
política? Disso tratam nossas conversas com o governo.
Pelo jeito que você fala sobre a sua
vida nas Farc, parece que não existe guerra. Também clipe que gravaram a impressão é
que se trata de uma banda alegre.
Tanja Nijmeijer: E isso é o que somos. Se você não está
feliz, não consegue aguentar. São precisamente os momentos mais difíceis que
nos inspiram a maioria das piadas.
As Farc são conhecidas por impor penas
severas para violações e a pena de morte por deserção.
Tanja Nijmeijer: Quando uma vez liguei escondida para
casa, o castigo foi cavar mais de 30 metros e escrever 20 páginas sobre meu
delito. Somos um exército e deve haver disciplina. Mas quem nos abandona é um
traidor.
Você já assistiu a alguma execução?
Tanja Nijmeijer: Não. Mas já ouvi falar sobre elas.
Você se tornou mais dura ao longo dos anos?
Tanja Nijmeijer: Nós, os guerrilheiros, somos duros por
fora, mas macios por dentro.
Você estaria disposta a pedir desculpas
para suas vítimas? (Ele olha com raiva)
Tanja Nijmeijer: Há um ditado que diz: “O povo sabe quem
são seus algozes”. O governo tenta nos transformar em agressores, em vez
vítimas.
Como o objetivo que vocês perseguem é
bom, não há nada que seja reprovável?
Tanja Nijmeijer: Eu não tenho que me justificar. A luta é
justificada. Estamos em guerra.
FONTE: GLOBO.COM
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