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segunda-feira, janeiro 25, 2010

Concessão da posse de terras quilombolas é 400% menor no governo Lula em relação à gestão FHC

Atual presidente do Incra atribui baixos números à burocracia


Focado nas políticas públicas sociais, o governo Luiz Inácio Lula da Silva perde para o do tucano Fernando Henrique Cardoso quando o assunto é a regularização de terras quilombolas. Embora o petista tenha destinado R$ 2.003.296.542 para serem aplicados na área entre 2008 e 2011 — valor que inclui gastos com saúde, educação, construção de moradias, eletrificação, recuperação ambiental e incentivo à produção local —, o número total de área para as quais foram concedidos títulos definitivos a seus ocupantes é quase 400% inferior ao montante normalizado durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso. Enquanto o atual governo reconheceu aos descendentes de escravos a posse de 174.469 hectares, área equivalente a quase 175 mil campos de futebol, a soma alcançada pela administração anterior foi de 780.861 hectares. A diferença também é verificada na quantidade de famílias favorecidas. Enquanto o tucano beneficiou 6.853 famílias, Lula chegou a apenas 4.217.

Para justificar os baixos números de regularização de terras quilombolas conseguidos pelo governo petista, o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, culpa a burocracia. “O processo pode se estender por mais de uma década. Infelizmente não podemos fazer nada para agilizar isso”, diz o presidente. Segundo ele, o procedimento para que uma comunidade consiga o título definitivo das terras implica em diferentes e demoradas etapas. “A primeira é a certificação concedida pela Fundação Cultural Palmares (FCP). Em seguida, depois da abertura do processo no Incra, é emitido o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação RTID. Após a publicação desse relatório, decorre um prazo para o recebimento de eventuais contestações de interessados particulares. Caso essas reclamações não sejam procedentes, o RTID é aprovado em definitivo. Depois dessa fase, publicamos portaria reconhecendo e declarando os limites do quilombo”, explica, ao tentar resumir pontos referentes à longa tramitação desses processos.


Às escuras

Em Paracatu, a 230km de Brasília, o Correio encontrou algumas das vítimas dessa morosidade. Na comunidade quilombola Família dos Amaros, descendentes de escravos aguardam desde 2004, quando recebeu a certificação de autodefinição da FCP, que o Incra emita o RTID. “Eles já vieram aqui algumas vezes. Mas até agora o Incra não deu nenhum documento”, cobra a presidente da associação, Maria da Abadia Pereira, 63 anos. “Prometeram colocar luz para a gente, mas nem sinal. Aqui perto tem postes e já chegou luz”, protesta Maria. Também descende de escravos, Cândida Pereira Melo, 55 anos, não vê a hora de poder usufruir dos benefícios da rede elétrica. “Seria muito bom ter nosso território de volta e um fio para ligar a luz”, sonha ela na companhia do marido Moacir de Melo, 64 anos.

Território



Criado a partir de uma ordem de serviço, o RTID é elaborado por uma equipe multidisciplinar do Incra e tem o objetivo de identificar e delimitar o território de um quilombo reivindicado pelos descendes
de escravos. O documento inclui informações cartográficas, fundiárias, agrônomas, ecológicas, geográficas, socioeconômicas, históricas e antropológicas.

Os dados, segundo o Incra, são coletados em pesquisas de campo e junto com instituições públicas e privadas. Depois de concluído, o RTID, o mesmo deve ser aprovado pelo Comitê de Decisão Regional (CDR).

Comparações



Confira os números petistas e tucanos na regularização das terras dos quilombolas

  • Governo FHC com 46 títulos e total de 780.861 hectares
  • Governo Lula com 60 títulos e total de 174.469 hectares
Fonte: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)

Prefeito na briga


Conhecida por seu patrimônio histórico e pela produção de ouro, grãos e pecuária leiteira, o município de Paracatu, a 230km de Brasília, é palco de uma disputa secular por terras remanescentes de quilombos. Uma das mais emblemáticas é entre a Família dos Amaros e os latifundiários que não os reconhecem como descendentes de escravos, embora a Fundação Cultural Palmares tenha emitido certificado de autodefinição para o grupo em 2004. De acordo com a presidente da Associação dos Amaros, Maria da Abadia Pereira, a área reivindicada é de 1.083 hectares, enquanto o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) delimitou 930 hectares como território quilombola.

Um dos maiores adversários da Família dos Amaros no processo de titulação da área reivindicada é o próprio prefeito de Paracatu, Vasco Praça Filho (PMDB). “Minha família comprou essa propriedade há mais de 20 anos e vamos lutar até o fim por essas terras. Mesmo que o Incra reconheça, vamos recorrer em todas as instâncias. Eles não são quilombolas. Apenas uma família vive no local”, anuncia, se referindo a única casa de barro erguida na área original do quilombo, onde moram cinco integrantes da Família dos Amaros. A pequena casa serve para assegurar o direito de posse da terra aos outros quilombolas, que deixaram a região e criaram o bairro de Paracatuzinho, situado na periferia da cidade.
FONTE: CORREIO BRASILIENSE

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