A greve histórica da educação em 2012 arrancou importantes vitórias para as estudantes
O ano de 2012 ficou marcado no movimento estudantil por uma grande greve da educação, que varreu as universidades e institutos técnicos de todo o país. Os estudantes deram o exemplo em diversos aspectos da luta: no internacionalismo, inspirados nos ventos que sopravam da Europa e das revoluções árabes; na unidade com a classe trabalhadora e na total independência em relação às reitorias e ao governo, formando o Comando Nacional de Greve dos Estudantes (CNGE), por iniciativa da ANEL e por fora da UNE, mostrando que é necessário ter as mãos livres para lutar pela juventude.
Mas queremos chamar atenção para outro aspecto da luta que também foi exemplar: tanto no CNGE quanto nos comandos locais, as reivindicações específicas das mulheres jovens e trabalhadoras foram parte importante do movimento grevista. A incorporação das demandas femininas foi causa e, ao mesmo tempo consequência, de uma forte participação das estudantes na luta, cumprindo papel central na organização da greve, dirigindo atos, assembleias, comandos e ocupações.
Uma das reivindicações que teve destaque foi por creches universitárias. O que ocorre hoje é que a maioria das mulheres que engravidam é jovens em idade universitária e, na prática, elas acabam tendo que escolher entre ser mães ou estudar. Isto porque as reitorias e os governos fecham os olhos para esta realidade e não dão qualquer condição dessas jovens exercerem seu direito à maternidade. Sabemos que não existe uma política suficiente de assistência estudantil nas universidades, muito menos uma assistência estudantil voltada às mulheres, especialmente para aquelas que são mães.
Muito pelo contrário. Os filhos das estudantes são na maioria das universidades impedidos de entrar nos bandejões; as mulheres que engravidam são expulsas do alojamento, não existe direito à licença maternidade etc.
É por isso que a ANEL tem em seu programa a luta contra a opressão como parte da luta contra a exploração, e está no dia-a-dia lutando pela demanda das estudantes, como fez na greve.
Três exemplos a serem seguidos
Na UFRJ, tudo começou com a primeira assembleia da greve que contava com mais de 2000 estudantes. Durante a assembleia, um caso de machismo envolvendo dirigentes do movimento instigou as jovens militantes a se organizarem e a chamarem um Encontro de Mulheres da universidade. Nesse encontro, se destacou a importância da incorporação das demandas das mulheres na greve e se tirou uma pauta de reivindicações. Também se debateu sobre a importância de se fazer da luta das jovens uma luta de todo o movimento estudantil, ganhando também os homens para lutarem em conjunto.
A campanha pela creche universitária foi, então, parte de todas as mobilizações, desde os atos até a ocupação do Canecão. Nas negociações com a reitoria, o tema foi prontamente discutido, pois, segundo os ativistas, a reitoria parecia ter “medo” de não pautar o tema e parecer não se importar com essa questão. Essa postura é uma vitória do movimento e não uma sensibilidade maior dos nossos governantes em apontar soluções para nossos problemas.
Na Federal do Rio de Janeiro já existe uma creche, mas que só atende às funcionárias da universidade, e mesmo assim completamente insuficiente. A partir da intensa mobilização da greve, a reitoria se comprometeu em aumentar o número de vagas na creche e passar a contemplar também as mães estudantes. Além disso, se comprometeu em rever a regra da expulsão do alojamento estudantil das mulheres que engravidam, dizendo que nem sabia que isso ocorria.
Na UFPR, em Curitiba, o movimento também foi vitorioso. Lá, não existe creche universitária. Mesmo amparada em uma lei completamente absurda, o Decreto 977/93, que proíbe a construção de novas creches nas universidades onde não existe, a reitoria não conseguiu escapar e teve que ceder ao movimento uma vitória parcial. Foi prometida a instituição de auxílio creche para as estudantes mães. Sabemos que a reivindicação histórica das mulheres trabalhadoras é de educação infantil nos locais de trabalho e estudo. Mas, diante da imensa necessidade das mulheres trabalhadoras e estudantes de garantirem suas condições para se manterem nos estudos, essa é, sem dúvida, uma grande vitória.
Na Universidade Federal Fluminense (UFF), de Niterói (RJ), existe uma creche que atende aos filhos das estudantes e também das funcionárias, uma conquista do movimento da educação. Os funcionários da creche eram terceirizados, sem vínculo com a universidade. Com a pressão da greve, a reitoria se comprometeu em mudar essa situação. Isso tem a ver com a garantia da qualidade da educação infantil, além dos direitos trabalhistas do quadro de funcionários.
As lições que as conquistas nos deixam
Para além de serem vitórias concretas, necessárias ao conjunto da classe trabalhadora e da juventude, esses acontecimentos nos deixam lições.
A primeira delas é que a organização das mulheres é indispensável para arrancarmos vitórias. Ao mesmo tempo em que a incorporação das demandas das mulheres foi fundamental para fortalecer a luta em geral dos grevistas de todo o país, a luta das estudantes só foi vitoriosa pelo fato de estar unificada em uma luta mais geral. A luta por creches universitárias, assim como pelo fim do assédio sexual e moral às jovens, e todas as reivindicações especialmente voltadas para as mulheres, são na realidade uma pauta do conjunto do movimento estudantil, homens e mulheres, que devem se unir contra os ataques e pelos nossos direitos. Pois trata-se de fortalecer a luta por uma universidade de qualidade, democrática e para todos. E isso não é tarefa apenas das mulheres.
A outra lição é sobre os métodos de luta. Muito se fala hoje em dia sobre as novas formas de lutar e de se organizar. É muito bom que o movimento consiga inovar em suas formas, usar e abusar da criatividade. Mas nessa greve se provou a importância dos métodos tradicionais de luta da classe trabalhadora e da juventude. Foi com muitos atos, assembleias, ocupações de reitoria e manifestações de rua, no contexto de uma greve nacional da educação e do funcionalismo público, que a gente fez com que nossa voz fosse ouvida. Com a unidade dos homens e mulheres do movimento estudantil e dos trabalhadores que conseguimos arrancar essas vitórias.
Sabemos que, concretamente, essas vitórias ainda estão por vir, que hoje são promessas. Promessas importantes, pois arrancar das reitorias um compromisso em benefício das estudantes não é todo dia que se consegue. Mas para garantir a implementação das medidas, para tirá-las do papel, será necessário seguir forte na luta. A necessidade existe, a disposição por parte do movimento também. Agora, é ir à luta!
O estado que não garante o direito à maternidade, não tem direito de decidir sobre nossos corpos
O mesmo governo que praticamente expulsa das universidades as mulheres quando engravidam, criminaliza a prática do aborto. Ou seja, as mulheres não conseguem exercer seu direito de escolha sobre sua vida e seu corpo e, muitas vezes, têm os filhos muito jovens, pela imposição dessa sociedade hipócrita, e depois não encontram condições para serem mães. Dessa forma, o movimento deve também encampar a luta pela legalização do aborto, pelo direito da mulher decidir sobre o seu próprio corpo.
FONTE: OPINIÃO SOCIALISTA / CLARA SARAIVA E LELE HASTENREITER, DIREÇÃO NACIONAL DA JUVENTUDE DO PSTU
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