Preocupados com o projeto retrógrado do deputado Osmar Terra e com as internações compulsórias de viciados, participantes do Congresso Internacional sobre drogas alertam a presidenta
No governo Obama, a política de “guerra às drogas” continua em segundo plano e o czar antidrogas da Casa Branca já proclamou a sua falência. O passar dos anos revelou o equívoco da crença conservadora no proibicionismo. A tipificação criminal com pena de privação de liberdade para casos de posse de droga ilícita para uso próprio jamais serviu, no mundo inteiro, para inibir o consumo e mostrou-se contraproducente em termos de danos sociais. Em resumo, colocar o consumo como questão criminal é um equívoco e carimbar o usuário como criminoso, e no Brasil continua assim, é humanamente ilegítimo.
As legislações nos Estados democráticos não criminalizam a autolesão. No Brasil, o fumante de tabaco e aquele que se automutila ou tenta o suicídio estão fora do estatuto criminal-penal repressivo. Na legislação brasileira sobre drogas, os usuários, e eles se autolesionam, são criminalizados. Apenas não recebem pena de prisão. Aliás, uma mudança pela metade ocorrida no governo Lula. Antes de conquistar o primeiro mandato presidencial, Lula, em campanha e por meio de carta enviada ao secretário-geral das Nações Unidas, criticava as convenções da ONU por propor a criminalização do consumo.
Nos EUA, logo no primeiro mandato, Obama revogou a determinação do seu antecessor e proibiu a Polícia Federal de perseguir os consumidores de maconha para finalidade terapêutica. Agora, pelo decidido nas mesmas urnas que lhe deram o segundo mandato, não reagiu à aprovação, nos estados de Washington e Colorado, da liberação do uso da Cannabis. Como se sabe, o governo do republicano Bush reagia de forma diferente e acionava a Suprema Corte, sob argumento de somente a União deter competência para legislar sobre o tema das drogas proibidas.
Sobre guerras falidas, a preocupação atual de Obama centra-se em Guantánamo, ou melhor, em lá manter 166 presos. E 86 deles sem nenhuma prova nem processo judicial de envolvimento com o terrorismo internacional. Para piorar esse quadro de humilhações, o governo Obama, diante da greve de fome iniciada em 6 de fevereiro por cem detidos, determinou que 21 fossem submetidos à ingestão nutricional via nasal. Uma morte em Guantánamo é tudo o que Obama não deseja. Vale lembrar, o fechamento da prisão foi prometido por ele em 2008.
No governo Dilma, o Brasil mantém o tema das drogas proibidas em segundo plano e até a Secretaria Nacional para a prevenção às drogas ilícitas foi tirada do gabinete da Presidência da República e virou um apêndice do Ministério da Justiça, em vez de submetida à pasta da Saúde. As drogas são um assunto sociossanitário, deveria estar claro.
Acaba de acontecer em Brasília o Congresso Internacional sobre Drogas. Uma das preocupações ficou por conta do projeto de lei de autoria do deputado Osmar Terra (PMDB-RS), que passou a ter rápida tramitação no Congresso. Além da volta da pena de prisão ao surpreendido na posse de drogas para o próprio consumo, o projeto, na contramão de modelos com resultados importantes, como o de Portugal, propõe o tratamento compulsório, embarca no populismo e mergulha na inconstitucionalidade. O tratamento compulsório é adotado de forma policialesca em São Paulo e no Rio de Janeiro pelos governos de Geraldo Alckmin e Sérgio Cabral.
Na guerra às drogas de Bush, o Brasil viu-se forçado a adotar, como nos EUA, a chamada Justiça Terapêutica, ou seja, perante o juiz e após confessar, o usuário primário escolhe a cadeia ou o tratamento. Se reincidir, vai para a prisão. Passada a pressão norte-americana, Alckmin e Cabral resolveram, por meio de uma política desumana de higienização voltada à limpeza das ruas, partir para as internações compulsórias e sem políticas eficientes de apoio ao egresso.
Os participantes do Congresso Internacional elaboraram a denominada Carta de Brasília em Defesa da Razão e da Vida. E nessa fundamental carta, que a presidenta Dilma vai receber, consta o alerta: “Vemos com indignação autoridades do governo federal a se pronunciar a favor dessa prática. Conforme o relator especial sobre tortura e outros tratamentos cruéis ou desumanos, junto ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, a internação forçada de dependentes químicos constitui tortura”.
Com a palavra a presidenta.
FONTE: CARTA CAPITAL / por WÁLTER MAIEROWTCH
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