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quinta-feira, maio 22, 2014

Grupos que se manifestam contra a Copa explicam motivos dos protestos







Com um nome/sigla que fazia referência às mobilizações de indignados que começaram na Espanha 15 de maio de 2011, o ato “15M – Dia Internacional de Lutas Contra a Copa”, articulado pelo Comitê Popular da Copa (articulação horizontal e apartidária de movimentos sociais, organizações, coletivos e indivíduos) teve início, em São Paulo, às 17 horas da tarde de ontem, com a saída planejada para às 18 horas, da praça do Ciclista, na Av. Paulista, em direção ao Estádio do Pacaembu. Nas outras onze cidades brasileiras eleitas para sediar jogos da Copa, os coletivos locais ligados ao Comitê também realizaram diversas mobilizações.

“A gente tem um tipo de organização que não podemos chamar de trabalho de base, preferimos dizer que é uma construção coletiva”, define Vanessa Santos, integrante do Comitê em SP, ao discorrer sobre a articulação entre os inúmeros grupos que assinam o manifesto do 15M – “Copa sem povo: tô na rua de novo”. “Não sou eu quem tem que falar sobre moradia” exemplifica, “nós fazemos uma construção juntocom os movimentos de moradia, por exemplo”.

Pluralidade à esquerda
De fato, durante a concentração para o ato, era possível observar bandeiras e representantes de diversos movimentos de moradia, como o Movimento de Moradia na Região do Centro e a União de Movimentos de Moradia de SP; bem como a Escola de Samba Unidos da Lona Preta (do MST); e um punhado de organizações estudantis, tais como a ANEL, o Coletivo RUA, e muitos Centros Acadêmicos. Além disso, diversos indivíduos e coletivos autônomos, entre eles o Movimento Passe Livre e a Fanfarra do MAL.

Até mesmo os organizadores dos protestos que ficaram conhecidos como “Se não tiver direitos, não vai ter Copa” decidiram somar na mobilização do 15M. Para Rafael Padjal, que participou da construção destes atos, e também é membro do coletivo Território Livre, as mobilizações anteriores tinham, em sua maioria, pautas muito semelhantes a esta articulada pelo Comitê. “O Território Livre é o único que destoa, porque somos os únicos que pedimos o cancelamento da Copa — com a perspectiva de que seria uma demonstração de força do povo, e uma derrota para o governo”.

Rafael explica que a maioria das pautas defendidas pela frente “Não vai ter Copa” são vinculadas a direitos, como moradia, saúde, educação. “Essencialmente todos os grupos estão discutindo a mesma coisa, as diferenças são pequenas. O que separou estas duas frentes [do “Não vai ter Copa” e do Comitê] foi a vontade de ir para a rua antes, ou não; de acompanhar a juventude radicalizada que não saiu das ruas desde junho passado”, esclarece.

Para o jornalista e membro do coletivo Desentorpecendo a Razão, Pedro Nogueira, as diferenças são mais profundas: “o Comitê começa fazendo a pergunta certa: Copa para quem? Porque, na verdade, já não teve Copa, já vai ser uma Copa restrita, que não existe para a grande maioria dos brasileiros. O Comitê está junto dessas pessoas, dos removidos, junto com aqueles que estão sofrendo as maiores atrocidades por conta da Copa, e por isso conseguiu dialogar com muitos coletivos e movimentos autônomos, em uma demonstração de força do movimento popular”.

Recusa
Enquanto a noite caía e a concentração do ato atingiu seu ápice, com inúmeros grupos, palavras de ordem e baterias, parecia mesmo que a tônica e a força do 15M de fato eram a pluralidade de pautas e propostas poíticas – que se revelaram também extremamente populares; sempre à esquerda.

Neste momento, o filósofo Vladimir Safatle, que acompanhava tudo junto de grupos do PSOL (partido ao qual se filiou em setembro de 2013), comentou que a recusa da população à Copa é inacreditável: “a gente está há um mês da Copa e você não vê casa pintada, bandeira, essas coisas que você sempre via em todas as Copas, e esse ano a Copa é no Brasil, e você não vê. O povo brasileiro demonstrou uma consciência dos seus interesses absolutamente admirável.”

20 minutos
Já eram 19 horas quando o ato virou a esquina e começou a descer a Av. da Consolação e parou o tráfego desse lado da via, tocando e cantando animadamente sua recusa, contando com aproximadamente 7.000 pessoas, segundo os organizadores – ou 1.200, segundo a Polícia Militar de SP.

Menos de vinte minutos depois, três quadras abaixo pela Consolação, estouraram as primeiras bombas. A manifestação caminhava devagar, sem nem tempo de ser “violenta” ou “pacífica”, quando a Polícia tentou conter seu andamento, cercando-a pelas laterais, o que desencadeou um tumulto entre policiais e alguns manifestantes, seguido por forte repressão e correria.

Ao som das hélices de helicóptero, sob a fumaça das bombas de gases lacrimogênio e pimenta, os manifestantes tentaram retomar o ato, caminhando até a quadra seguinte, porém a repressão seguiu forte, provocando a dispersão quase completa do ato. Um grupo maior se deslocou para a Rua Augusta, e tentou subir de volta até a Paulista, onde foi recebido por mais viaturas e balas de borracha.

Um grupo menor tentou chegar até a Av. Pacaembu, seguindo o trajeto previsto originalmente, mas se dispersou no caminho. Grupos menores caminhavam a esmo na região do bairro da Bela Vista e da Praça Roosevelt, seguidos de perto por viaturas policiais. A Polícia Militar não informou o número de agentes participantes da ação.

Ao longe, ainda era possível ouvir o grito de ordem “não vai ter copa”. Enquanto isso, o Comitê Popular da Copa contabilizou ao menos 5 feridos por conta da repressão. Sete pessoas foram detidas para averiguação, ainda antes de o ato começar, e liberadas ao longo da noite. Em pouco tempo, já não havia mais nem sinal das viaturas e batalhões que tomaram as ruas. As pautas e a recusa, todavia, seguem as mesmas – assim como a sistemática falta de disposição ao diálogo por parte do Estado.

Ou ainda, nas palavras de Safatle, vinte minutos mais cedo: “Há um esgotamento da política, que se manifesta em várias coisas; quando a sociedade não consegue acreditar que o futuro vai ser melhor do que o presente, ela entra em um processo brutal de recusa, e a Copa apareceu como um sintoma muito forte deste processo. É preciso lembrar que desde 2011 estamos numa era de revolta, que não para mais. Essa pressão popular é fundamental, porque há uma tarefa atual: a tarefa de ultrapassarmos a democracia parlamentar, em direção à uma democracia real e direta. Como isso vai ser feito? É uma história que só começa a ser contada agora.”

FONTE: Beatriz Macruz e Caio Castor, especial para o Viomundo

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