Os dois potenciais terroristas presos na
quinta-feira 22 pela Polícia Federal de Curitiba tinham planos, entre outros,
de atacar estudantes do curso de Ciências Sociais da Universidade de Brasília.
Isso porque aqueles “esquerdistas” tinham ideais liberais sobre sexualidade e
direitos de minorias.
Emerson Eduardo Rodrigues e Marcelo Valle
Vieira Mello (“ambos com mais de 30 anos”, segundo a assessoria da PF)
pretendiam “atirar a esmo” também nos alunos a cursar faculdades de Direito e
Comunicação. Os ataques se dariam em uma casa de eventos utilizada pelos
alunos. Vieira Mello, diga-se, cursou Letras na UNB.
“As mensagens dizem que
dariam um tratamento especial àquele ‘câncer’, fazendo referência aos
estudantes, quando eles estivessem reunidos no local”, declarou o delegado
Wagner Mesquita, da PF no Paraná, em entrevista ao portal Terra.
Sem direito à fiança, os suspeitos
alimentavam um website hospedado na Malásia com conteúdo extremista. No
silviokoerich.org faziam ameaças de morte ao deputado federal Jean Willys
(PSOL-RJ), ofensas à presidenta Dilma Rousseff, a negros, homossexuais e
judeus. Teciam apologias à violência contra as mulheres, e, ao mesmo tempo,
incitavam o abuso sexual de menores.
Como se dá com psicopatas, as ideias dos dois
internautas extremistas são permeadas de contradições. Postavam fotografias de
cenas pornográficas a envolver crianças e adolescentes, e, ao mesmo tempo,
consideravam que os alunos de Ciências Sociais da UNB eram demasiado liberais
no quesito sexualidade.
Rodrigues e Vieira Mello também não poupavam
críticas a nordestinos.
Embora ofendessem a
mineira Dilma, esse ranço contra o Nordeste é embasado no antigo preconceito
contra Lula. Para conservadores, e por tabela extremistas, o sucesso do presidente
mais popular do Brasil é certamente algo difícil de engolir. A Bolsa Família
não passaria de uma ninharia para alimentar vagabundos. Houve, claro, o
mensalão durante o primeiro mandato de Lula, e isso serve de munição para os
conservadores e extremistas.
De qualquer forma, como explicar essas
tentativas de perpetrar ataques contra as vidas de estudantes e um deputado
federal no Brasil? Isso sem contar o inaudito reacionarismo. Em grande parte,
esse fenômeno decorre da radicalização de uma narrativa nacionalista na
“fascistofera” e na mídia canarinho.
Neste mundo globalizante
onde a tecnologia (leia internet) aproxima cada vez mais os povos, o conservadorismo
a reinar nos tabloides e redes de tevê nos Estados Unidos e na Europa logo
contagia outros países. E, por tabela, esse discurso neoconservador tem um
enorme impacto nos extremistas capazes de cometer atos de loucura. Esse
fenômeno ocorre na Europa, onde a islamofobia e a judeofobia são uma grande
preocupação. Mas, ao contrário do Brasil, onde a vasta maioria da mídia é
neoconservadora, na Europa e EUA há periódicos liberais que não aderem à essa
narrativa, entre eles o Le Monde, La Repubblica, The
Nation, etc. E mesmo diários conservadores como o Corriere della
Sera ou Le Figaro fazem o mesmo.
Qual a origem desse discurso nacionalista?
Em recente entrevista a CartaCapital,
o historiador francês Nicolas Lebourg, da Universidade de Perpignan, disse que
a atual narrativa de nacionalistas é uma reação à crise dupla que vivemos
nesses tempos. A primeira foi aquela geopolítica de 11 de setembro de 2001. A
segunda foi a econômica, iniciada em 2008.
A partir do 11 de Setembro, ideais
neoconservadores (“neocons”) migraram para a Europa. “São baseados no seguinte
quadro bastante simplista: o mundo livre seria o Ocidente, e do outro lado
existe o Islã.” Essa narrativa substituiu aquela da Guerra Fria, quando o
Ocidente lutava contra o totalitarismo soviético.
No Brasil, pelo menos
por ora, extremistas como os dois detidos pela PF não parecem estar atrás de
muçulmanos. A “luta” deles é contra os esquerdistas, e todos os outros males
que a ideologia deles encapsula. Aqui os esquerdistas ainda são chamados de
“comunistas”, termo anacrônico mundo afora mas, apesar da globalização,
ainda bastante utilizado. Basta moderar comentários no website da CartaCapital para
descobrir que colunistas a exprimir posições favoráveis à reforma da Lei da
Anistia ou à descriminalização do aborto são catalogados como comunistas.
Resta saber se tentativas de atentados como
os da dupla Rodrigues e Vieira Mello engatilharão ataques terroristas como
aqueles de Mohamed Merah, autor de sete assassinatos e morto por policiais em
Toulouse.
FONTE:carta capital
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