Em
entrevista ao iG, ministro afirma que reajuste tem amparo legal e defende
recursos do pré-sal para auxiliar municípios
Para o ministro da Educação, Aloizio Mercadante,
valorizar os professores brasileiros é meta fundamental para o País. Desde que
assumiu o comando do ministério, ele anunciou a distribuição de tablets para os
docentes do ensino médio, programas de formação, bolsas de estudo. Mas admite
que cumprir o piso salarial do magistério deve ser a primeira medida de Estados
e municípios para valorizar esse profissional.
Em entrevista ao iG, Mercadante afirmou que
essa não é uma tarefa fácil e que há um limite de contribuição do ministério
nesse sentido. “Temos outras responsabilidades a cumprir no apoio às
prefeituras”, lembra. Garantir recursos do pré-sal para a educação, na opinião
dele, pode ser uma boa solução para auxiliar os gestores municipais e estaduais
a garantir melhores salários aos educadores.
Durante a conversa de quase uma hora, o ministro
ressaltou que os cálculos feitos pelo MEC para reajustar o valor do piso são
baseados em determinações legais – rebatendo de forma discreta as críticas
feitas pelo governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, de que o ministro
teria “opinião furada” sobre esse assunto.
Em pouco mais de um mês à frente do MEC – cujo
orçamento é dez vezes maior do que o da Ciência, Tecnologia e Inovação, antigo
cargo de Mercadante –, o ministro se diz maravilhado com o desafio. “É um
ministério complexo, com uma agenda dinâmica, dimensões imensas. Eu considero o
maior desafio estratégico do Brasil ter uma educação de qualidade para todos”,
afirma.
Nos próximos meses,
Mercadante espera anunciar novos projetos para a alfabetização e o Exame
Nacional do Ensino Médio (Enem). Um novo programa para a educação no campo será
anunciado ainda este mês. Confira os principais trechos da entrevista:
iG:
Ministro, quais serão suas prioridades à frente do Ministério da Educação?
Aloizio Mercadante: Nosso primeiro esforço é acelerar o programa de creches e pré-escolas. Nós estamos contratando 1,5 mil creches por ano, no entanto, as prefeituras só estão conseguindo construir as creches num prazo de dois anos e meio. Montamos uma força-tarefa para, nos próximos 60 dias, verificarmos quais as medidas complementares podemos oferecer aos prefeitos e estamos terminando um estudo com o Inmetro para oferecermos serviços de engenharia de novos métodos construtivos, tipo estruturas pré-moldadas e novas tecnologias para acelerarmos isso. A deficiência é grande. Na pré-escola, estamos com 80% dos alunos matriculados, mas na creche temos em torno de 26% de cobertura.
Aloizio Mercadante: Nosso primeiro esforço é acelerar o programa de creches e pré-escolas. Nós estamos contratando 1,5 mil creches por ano, no entanto, as prefeituras só estão conseguindo construir as creches num prazo de dois anos e meio. Montamos uma força-tarefa para, nos próximos 60 dias, verificarmos quais as medidas complementares podemos oferecer aos prefeitos e estamos terminando um estudo com o Inmetro para oferecermos serviços de engenharia de novos métodos construtivos, tipo estruturas pré-moldadas e novas tecnologias para acelerarmos isso. A deficiência é grande. Na pré-escola, estamos com 80% dos alunos matriculados, mas na creche temos em torno de 26% de cobertura.
A segunda grande prioridade é alfabetizar na idade certa. Essa eu diria que é uma das grandes prioridades dessa gestão, porque nós temos uma disparidade muito grande. Só 4,9% das crianças do Paraná não são alfabetizadas até os 8 anos de idade. Em Santa Catarina, 5,1%, para darmos bons exemplos. Quando você vai para o Nordeste, em Alagoas, 35% das crianças não são alfabetizadas na idade certa. Quando há creche e pré-escola, você tem mais chance de alfabetizar na idade certa, por isso esse nosso esforço. Nós temos de formar os professores de forma continuada; ter material pedagógico consistente e disponível; precisamos motivar os professores, premiando e valorizando os resultados que venham a ter e temos de avaliar as crianças.
iG: O
programa alfabetização na idade certa vai incluir todas essas ações? Quando ele
começará a funcionar?
Mercadante: Todas. É um
projeto bem completo. Analisamos as melhores experiências do Brasil para
formatar esse projeto. Nesta quinta-feira, vou participar do encontro do Consed
(Conselho Nacional de Secretários de Educação) e quero discutir o projeto com
eles. É importante ouvir deles contribuições, esse tem de ser um grande pacto
nacional. Nós vamos disponibilizar recursos, materiais, formação para os
professores e motivá-los no programa. O melhor instrumento para isso é um novo
programa, o Escola sem Fronteiras, que promoverá estágios desses professores
nas melhores escolas do Brasil e do exterior. O pessoal da Capes está estudando
as modalidades possíveis, mas estamos pensando no período das férias.
iG: O
programa também prevê a oferta de bônus financeiro aos professores que tiverem
bons resultados?
Mercadante: Até agora, a
forma que achamos mais consistente de estimular os professores é com a bolsa do
Escola sem Fronteiras. Também tem de dar algum estímulo para escola. Ela também
tem de ser valorizada pelos resultados. Nós vamos discutir com os secretários
de Educação para concluirmos o desenho desse programa em parceria, de forma
consistente.
Nós estamos lançando também ainda agora em março, o Pronacampo. Só 15,5% dos jovens do campo estão no ensino médio. No campo, 23,2% de todas as pessoas com mais de 15 anos não estão alfabetizadas. O campo precisa ter um outro olhar por parte do Estado.
iG: O
senhor poderia adiantar quais serão as ações práticas desse programa?
Mercadante: Toda a produção de material didático vai ser nova, focada no campo. Vamos oferecer também um programa de formação de professores voltado para isso; construir novas escolas, inclusive escolas com alojamentos. Nos últimos sete anos, tivemos mais de 30 mil escolas fechadas no campo. Estamos fixando também que, para fechar uma escola, a prefeitura ou Estado seja obrigado a consultar os conselhos estaduais e municipais de educação. Vamos estabelecer alguns critérios para o fechamento de escolas acontecer. Às vezes, é necessário, mas tem havido uma política de reduzir despesas, transferindo o ônus para o aluno. É muito mais fácil e barato para uma prefeitura, em vez de ter uma escola no interior, comprar um ônibus e fazer o aluno andar 100 km pra ir e mais 100 pra voltar.
Mercadante: Toda a produção de material didático vai ser nova, focada no campo. Vamos oferecer também um programa de formação de professores voltado para isso; construir novas escolas, inclusive escolas com alojamentos. Nos últimos sete anos, tivemos mais de 30 mil escolas fechadas no campo. Estamos fixando também que, para fechar uma escola, a prefeitura ou Estado seja obrigado a consultar os conselhos estaduais e municipais de educação. Vamos estabelecer alguns critérios para o fechamento de escolas acontecer. Às vezes, é necessário, mas tem havido uma política de reduzir despesas, transferindo o ônus para o aluno. É muito mais fácil e barato para uma prefeitura, em vez de ter uma escola no interior, comprar um ônibus e fazer o aluno andar 100 km pra ir e mais 100 pra voltar.
No ensino médio, o que nós identificamos é uma evasão escolar muito alta. Uma parte é por causa da defasagem idade-série que vai se acumulando e se manifesta no ensino médio com o abandono da escola. A outra é que, para grande parte dos alunos, é preciso associar trabalho e educação, o que vamos fazer com o Pronatec. Além disso, a escola precisa ficar mais interessante. Um dos instrumentos mais importantes e rápidos nesse sentido é a distribuição do tablet com projetor digital, para que o professor melhore e crie um ensino interativo na sala de aula. Estamos distribuindo lousa digital, vamos dar toda a produção do Khan Academy, traduzida em parceria com a Fundação Lemann, e o Portal do Professor já tem 15 mil aulas prontas. Esse material vai dar um salto de qualidade na sala de aula.
iG: O
senhor acredita que distribuir esse material muda a divisão cultural entre
professores e alunos no que diz respeito à tecnologia?
Mercadante: O arranjo social da escola é do século 18. Os professores são do século 20 e os alunos, do século 21. Eles são nativos digitais. Temos que chegar no aluno. Começando pelo professor, a gente chega mais seguro. É inimaginável um professor do século 21 não poder entrar no Google. Isso vai mudar. Nós já vamos até aumentar a distribuição. Além de dar o tablet aos professores do ensino médio, vamos estender o programa para todos os alunos que participam do Programa Institucional de Iniciação à Docência (Pibid). Os universitários que estão se formando e fazendo estágio na escola pública vão ter o equipamento, para que eles cheguem na escola preparados para trabalhar novas tecnologias para a educação. Fizemos um seminário com 27 grupos de pesquisa do País na semana passada e a avaliação da inclusão digital na escola é excelente. Estamos montando um relatório completo agora. Todos têm a avaliação de que o processo gera motivação, criatividade, interatividade. É uma mudança de paradigma, que o Brasil tem de enfrentar.
Mercadante: O arranjo social da escola é do século 18. Os professores são do século 20 e os alunos, do século 21. Eles são nativos digitais. Temos que chegar no aluno. Começando pelo professor, a gente chega mais seguro. É inimaginável um professor do século 21 não poder entrar no Google. Isso vai mudar. Nós já vamos até aumentar a distribuição. Além de dar o tablet aos professores do ensino médio, vamos estender o programa para todos os alunos que participam do Programa Institucional de Iniciação à Docência (Pibid). Os universitários que estão se formando e fazendo estágio na escola pública vão ter o equipamento, para que eles cheguem na escola preparados para trabalhar novas tecnologias para a educação. Fizemos um seminário com 27 grupos de pesquisa do País na semana passada e a avaliação da inclusão digital na escola é excelente. Estamos montando um relatório completo agora. Todos têm a avaliação de que o processo gera motivação, criatividade, interatividade. É uma mudança de paradigma, que o Brasil tem de enfrentar.
iG: O
senhor falou da importância de valorizar o professor, dar estímulos, oferecer
tecnologia e formação para que eles trabalhem melhor. Mas não é preciso dar
melhores salários e carreira para que essa valorização ocorra?
Mercadante: Não há
nenhuma tecnologia que possa substituir a relação professor-aluno, agora essa
relação pode melhorar com boas tecnologias educacionais. A primeira forma de
valorizarmos o professor hoje é cumprir o piso. Eu reconheço que é um reajuste
forte e que há dificuldades reais. Agora, nós estamos falando em pouco mais de
dois salários mínimos. Se nós quisermos ter professores de qualidade no Brasil,
é preciso oferecer salários atraentes. Se não, tudo o mais que estamos falando
não vai acontecer a médio prazo. Além disso, há a discussão da jornada, que
deve ser um objeto de ampla negociação com os professores e entidades
sindicais. A hora-atividade não pode ser tratada como uma questão trabalhista,
desassociada de uma dimensão pedagógica.
iG: O
MEC pode ajudar mais as prefeituras e os Estados a cumprir o pagamento do piso?
Mercadante: Nós
repassamos, no mínimo, 60% do Fundeb para pagamento de salário. Tivemos um
aumento significativo de repasse do MEC para Estados e municípios. O
crescimento do orçamento do MEC foi exponencial nesses anos. Tudo isso é
repassado na ponta. Temos de ter um pacto federativo em torno desse caminho.
Temos outras responsabilidades a cumprir no apoio às prefeituras, como, por
exemplo, as creches, a alfabetização na idade certa, o Pronacampo. Os
investimentos tem de ser mantidos.
iG: O
governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, deu uma declaração polêmica sobre
a opinião do senhor sobre o piso...
Mercadante: A regulamentação do piso salarial foi votada por unanimidade pelo Congresso Nacional em 2008. Depois, o Supremo Tribunal Federal julgou uma ação confirmando a legalidade da lei do piso. Os parâmetros que o MEC utilizou para calcular o reajuste nesses três anos estão na lei aprovada, amparados por um parecer técnico da Advocacia Geral da União. Eu reconheço que há dificuldades para cumprir o piso, em grande parte dos casos por causa da estrutura da carreira, mas a maioria dos Estados já encontrou caminhos para resolver. Acho que os recursos dos royalties do pré-sal podem ser uma boa saída para nos ajudar nesse sentido.
Mercadante: A regulamentação do piso salarial foi votada por unanimidade pelo Congresso Nacional em 2008. Depois, o Supremo Tribunal Federal julgou uma ação confirmando a legalidade da lei do piso. Os parâmetros que o MEC utilizou para calcular o reajuste nesses três anos estão na lei aprovada, amparados por um parecer técnico da Advocacia Geral da União. Eu reconheço que há dificuldades para cumprir o piso, em grande parte dos casos por causa da estrutura da carreira, mas a maioria dos Estados já encontrou caminhos para resolver. Acho que os recursos dos royalties do pré-sal podem ser uma boa saída para nos ajudar nesse sentido.
iG: O
senhor acredita que com a proposta atual do relator do Plano Nacional de Educação no Congresso de investir 8% do PIB em educação essas
contas fechariam?
Mercadante: Precisamos
votar logo o PNE, agora, para mim, a discussão mais relevante, além da fixação
desse patamar, é associarmos o pré-sal à educação. Pelo menos 30% dos
royalties. A gente poderia começar com participação maior e diminuir ao longo
do tempo, fixar durante um período da história do Brasil, depois podemos cuidar
de outros temas.
iG:
Existem propostas para federalizar a carreira do professor? O senhor acredita
que essa seja uma boa opção para alavancar a valorização desse profissional?
Mercadante: O Brasil tem
o território do tamanho que tem, porque construiu um pacto federativo
continental. Há um comando constitucional de que a educação é feita em regime
de cooperação, de complementação. O papel do MEC é de assessoria técnica e
financiamento. Os professores dos municípios e dos Estados são concursados, têm
direitos adquiridos, têm uma carreira em andamento, o que nós temos é que
trabalhar em parceria. Ter um grande pacto e trabalharmos na mesma direção.
iG: O
senhor havia falado em criar equipes de professores que visitassem as casas das
crianças dentro do programa alfabetização na idade certa. Isso se mantém?
Mercadante: Nossa
expectativa – mas essa definição será feita em cada município – é de que os
bolsistas do Pibid, que chegarão a 45 mil este ano, possam fazer visitas
domésticas, como se fosse um médico da família. Em vez de Saúde da Família,
teríamos um Educação na Família. Visitar, conhecer o ambiente ajudariam esses
universitários a saberem das dificuldades dos alunos quando entrarem na
profissão. E poderia reforçar o acompanhamento pedagógico das crianças. Essa
experiência foi muito exitosa onde já foi feita, como no Uruguai.
iG: O
senhor já definiu mudanças para o Enem? Há uma meta de ampliação do banco de
itens para este ano? E o que vai mudar na redação?
Mercadante: Na semana passada, 24 universidades estiveram trabalhando online, inclusive no final de semana, para reforçar o banco de itens e foi um sucesso espetacular. Reforçamos muito o banco. Vai dar muito mais segurança ao processo. Nossa meta é chegar ao padrão americano, com 100 mil itens. Eles demoraram 85 anos, nós temos de chegar antes, mas o número de itens é uma informação reservada do Inep para a segurança do sistema. Nós vamos mudar a correção da redação. Não temos ainda uma posição fechada. Criamos um comitê de governança do Enem, com participação das universidades e um comitê técnico-científico, com avaliadores convidados e a equipe do Enem. Eles estão discutindo algumas alternativas para dar mais segurança à correção e diminuir a dispersão das notas, além de fortalecer os corretores. A redação sempre tem alguma subjetividade, então estamos aguardando os estudos para poder bater o martelo. Ter mais corretores é uma das hipóteses.
Mercadante: Na semana passada, 24 universidades estiveram trabalhando online, inclusive no final de semana, para reforçar o banco de itens e foi um sucesso espetacular. Reforçamos muito o banco. Vai dar muito mais segurança ao processo. Nossa meta é chegar ao padrão americano, com 100 mil itens. Eles demoraram 85 anos, nós temos de chegar antes, mas o número de itens é uma informação reservada do Inep para a segurança do sistema. Nós vamos mudar a correção da redação. Não temos ainda uma posição fechada. Criamos um comitê de governança do Enem, com participação das universidades e um comitê técnico-científico, com avaliadores convidados e a equipe do Enem. Eles estão discutindo algumas alternativas para dar mais segurança à correção e diminuir a dispersão das notas, além de fortalecer os corretores. A redação sempre tem alguma subjetividade, então estamos aguardando os estudos para poder bater o martelo. Ter mais corretores é uma das hipóteses.
iG: O
senhor assumiu o ministério com uma denúncia revelada pelo iG sobre
irregularidades no Prouni e determinou mais transparência à divulgação de
preços e descontos. O MEC vai fiscalizar o cumprimento da portaria?
Mercadante: Fizemos uma
reunião com todas as associações e entidades do setor privado e eles se
comprometeram em autorregular o padrão de fixação das normas exigidas pela
portaria. Vamos fiscalizar e exigir. É muito importante dar transparência ao
pagamento de matrículas, com esses dados disponibilizados para darmos mais
segurança aos estudantes. Eles têm direito à informação. Antes de pensar em
penalidades, o que nos interessa é assegurar que isso seja implementado.
FONTE: Priscilla Borges, iG Brasília
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