Os garis que, segundo o prefeito Eduardo Paes (PMDB), fizeram um motim, entram em uma disputa pelo controle do sindicato
Atropelada por uma jovem liderança
que se forjou a partir da campanha salarial em janeiro, a diretoria do
Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio e Manutenção do município do Rio
de Janeiro, que engloba os garis da Companhia Municipal de Limpeza Urbana do
Rio de Janeiro (Comlurb) e trabalhadores de empresas privadas, se vê ameaçada
de perder o poder que mantém há mais de duas décadas.
Estes jovens empregados da Comlurb,
muitos dos quais só se conheceram na campanha salarial, além de imporem ao
prefeito Eduardo Paes (PMDB) uma das suas maiores derrotas políticas – após
recusar negociar com o movimento que classificou de motim ele teve que ceder o
aumento que recusava dar – agora estão de olho na entidade de classe.
No fim de março, o grupo composto de
dez pessoas que liderou na prática a paralisação dos garis deixando a cidade
repleta de lixo no carnaval carioca, foi ao sindicato em busca do seu Estatuto.
Embora seja um documento que todos deveriam conhecer, ele era guardado a sete
chaves. A movimentação deles tem por finalidade as eleições de abril, quando
tentarão trocar a diretoria que há mais de vinte anos reveza-se nos cargos,
mantendo-se no poder. Hoje, o presidente é Luciano David de Araújo e seu vice,
Antônio Carlos da Silva, que antes ocuparam outros cargos.
De olho nas eleições, eles começaram
a lutar por postos chaves para a mobilização das chamadas bases. Entraram na
disputa pelas vagas nas Comissões Internas de Prevenções de Acidentes (CIPAs) –
conquistaram pelo menos 10 das 35 existentes – e, por meio de abaixo-assinados
da categoria, cobram eleições para os 35 cargos de delegados sindicais junto às
gerências da empresa, hoje ocupados por indicações da diretoria do sindicato.
Nos dois casos há estabilidade no emprego, o que facilita a mobilização dos
trabalhadores.
Durante duas semanas, CartaCapital
procurou o presidente Araújo. Além de não conseguir encontrá-lo no sindicato,
não obteve retorno das ligações telefônicas. Quem falou pela entidade foi seu
vice, Silva. Ele reconhece que o movimento – por ele classificado de “maluquice
que deu certo” – foi vitorioso: 37% de aumento no piso salarial que dos 803
reais pulou para 1,1 mil reais. A reivindicação era de 1,2 mil reais, mas se
prevalecesse o acordo assinado por Paes com o sindicato, o reajuste ficaria em
9%, com um piso de 847 reais. Além disso, o tíquete de refeição de 12 reais,
que o prefeito quis passar para 16 reais, chegou aos 20 reais.
Mas, Silva aposta que a categoria
continuará acreditando nas antigas lideranças, respaldando-se no que chama de
importantes conquistas: “de toda a pauta negociada, apenas estes dois itens não
estavam no acordo feito pelo sindicato”, afirma.
O que ele e Araújo parecem não
enxergar é o sangue novo que surgiu na categoria. Prova disso foi o movimento do
último Carnaval que, demonizado pelo prefeito com a ajuda de órgãos de
comunicação como a Rede Globo, ganhou apoio popular. O próprio prefeito,
conforme relatou um desses líderes, o gari William Rocha de Oliveira, 10 anos
de Comlurb, admitiu, na presença dos atuais presidente e vice da entidade, que
o “sindicato me ferrou”.
Essa nova liderança, que surpreendeu
aos próprios cariocas, tem gente que talvez nem permaneça por muito tempo na
empresa de limpeza urbana. São trabalhadores que sonham mais alto e estão
prestes a conquistar o diploma universitário. Bruno Lima, 28 anos, solteiro,
pai de uma menina, há oito anos como gari, hoje cursa o sétimo período de
Serviço Social do Centro Universitário Augusto Mota e divide seu tempo em um
estágio atendendo a dependentes químicos. Leonardo Mendes de Magalhães, 28
anos, trocou o Citibank em 2012 pela estabilidade nas cozinhas das escolas
municipais na função de Agente de Preparo de Alimentos (APA), que no Rio são
contratados pela Comlurb. Casado com uma professora do estado, sem filhos, está
concluindo o curso de Ciências Contábeis. Já Wladimir Fonseca frequenta uma
Faculdade de Direito.
Embora sejam bastante politizados, a
quase totalidade deles foge a qualquer ligação com partidos políticos. A
exceção é Célio Viana, 12 anos de Comlurb, filiado ao PR de Anthony Garotinho,
pelo qual já concorreu, sem sucesso, a uma vaga de vereador na cidade. “Mas não
relaciono a filiação partidária com o movimento”, diz. Os demais evitam contato
com os políticos e deixaram sem resposta as mensagens de felicitações de
Garotinho, enviadas para seus celulares, durante a greve.
Outro ponto em comum é não aceitarem
doações financeiras e ajuda de desconhecidos. Penam fazendo “vaquinhas” entre
uma categoria que ganha mal e tem pouca politização. Na paralisação, só
admitiram a verba do Sindicato dos Petroleiros, gasta na compra de quentinhas e
de garrafas de água, necessárias nas mobilizações realizadas nas ruas da
cidade. Do Sindicato dos Trabalhadores em Universidades Federais – Sintuf, contaram
com a ajuda do carro de som. De outras entidades, aceitaram apenas a impressão
de panfletos e boletins distribuídos entre os colegas.
Para desespero da atual diretoria,
essa nova liderança se mostra disposta a desvendar as possíveis relações esdrúxulas
de alguns diretores sindicais com a empresa de limpeza urbana do município ou
mesmo a prefeitura. Falam em possíveis verbas que o sindicato receberia. Mas
não só isso. Viana, no fim de março, registrou queixa de ameaça, na 18ª
Delegacia, contra o vice-presidente do sindicato. A ameaça teria surgido após
questioná-lo sobre o emprego do filho, há 12 anos, em um cargo de confiança –
portanto, sem concurso – na Comlurb.
“Isso é nepotismo da diretoria do sindicato”, denunciou. Silva, a
CartaCapital, admitiu que o filho tem esse emprego, mas considera que isso não
é uma tentativa da empresa em cooptá-lo: “se fosse esse o caso, eu teria a
minha família toda na Comlurb. Não é por aí”, esbravejou.
FONTE: CARTA CAPITAL / Marcelo Auler
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