Cerca de 60% dos professores da rede municipal da cidade de São Paulo têm distúrbios na voz — uma prevalência cinco vezes maior que no resto da população. De acordo com uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, o estresse no trabalho está fortemente associado com essas doenças e elas aumentam de 6 a 9,5 vezes as chances de o professor tornar-se incapaz para o trabalho.
A fonoaudióloga Susana Giannini avaliou 167 professores de ensino infantil, fundamental e médio com distúrbios de voz na cidade de São Paulo. Ela comparou-os com 105 colegas saudáveis, provenientes das mesmas escolas. Depois, Susana analisou os grupos com duas escalas:uma media o nível de estresse no trabalho e outra, a capacidade para o trabalho.
A pesquisadora encontrou uma associação estatística entre ter distúrbios vocais e estresse provocado pela organização do trabalho — indício de que o estresse pode ser uma causa dos distúrbios vocais. O estresse era medido pelos níveis de excesso de trabalho e falta de autonomia sobre o trabalho dos professores.
Cerca de 70% daqueles que tinham problemas vocais apresentaram excesso de trabalho, mostrando que a pressão para realizá-lo era média ou alta. Já nos professores saudáveis a porcentagem era de 54,4%.
Os professores com distúrbios de voz também tiveram menor autonomia para realizar seu trabalho. Cerca de 73% dos professores com distúrbio de voz mostraram ter pouca ou média autonomia sobre o trabalho. Já nos professores sem alteração vocal, a porcentagem é de 62,1%.
“A condição de estresse é de alto desgaste”, explica Susana. Nesse nível, o professor perde a possibilidade de criar e intervir no trabalho. Ele tem muitas tarefas para desempenhar e não consegue criar soluções para os problemas que aparecem.
Incapacidade
A pesquisa analisou os professores com um índice que media a capacidade de um trabalhador desempenhar suas tarefas em função do seu estado de saúde, capacidades físicas e mentais, e exigências do trabalho. O resultado foi que professores com distúrbio vocal tem chances de 6 a 9,5 vezes maiores de não ter condições de executar o trabalho antes de chegar à aposentadoria.
“Com o adoecimento da voz, o professor se aposenta mais cedo ou precisa sair da sala de aula, vai pra secretaria fazer trabalho burocrático. É como se o distúrbio interrompesse sua carreira precocemente. E isso reduz a satisfação com o trabalho”.
De acordo com a pesquisa, as novas políticas do governo para inclusão de alunos aumentaram a carga de trabalho dos professores, que passam a ter de ensinar alunos com níveis de conhecimento diferentes. As salas de aula também aumentaram de número e os estudantes passam mais tempo na escola. “No entanto, não aumenta a estrutura das escolas”, diz a pesquisadora. “O professor tem de dar conta sozinho de mais trabalho. Aumenta a pressão e o volume do trabalho, que vai invadindo o espaço familiar e social. O professor não dá conta de transmitir o conteúdo planejado”.
Na opinião de Suzana, o estudo pode ajudar a rever as regras da previdência social, que não reconhecem perda da voz do professor como doença relacionada ao trabalho. “A pesquisa levanta que o professor pode adoecer e ser incapacitado de trabalhar em sua função quando relaciona muito trabalho com pouca autonomia”, indica a fonoaudióloga. “Se for compreendido que isso é causado pelo trabalho, eu tenho que ter políticas públicas que reconheçam esse nexo causal. Se alguma lei compreender que o disturbio de voz está relacionado ao trabalho, o professor deixa de arcar sozinho com a doença que adquiriu”.
FONTE:Agência USP
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